Quinta, 07 Outubro 2021 11:38

1000 dias de solidão: povo fraturado e país despedaçado

Prof. Helder Nogueira Andrade Professor Efetivo da Rede Pública Estadual de Ensino do Estado do Ceará. Doutor em Ciências Sociais (UFRN); Mestre em Ética e Filosofia Política (UECE); Especialista em Gestão e Políticas Públicas (FESPSP/Fundação Perseu Abramo; Historiador (UFC). Atualmente é membro da Direção Nacional da CUT; Vice-Presidente da CUT-Ceará; Vice-presidente do SINDIUTE; Secretário Estadual de Organização do PT-Ceará; Membro efetivo do Conselho Estadual do Trabalho no Ceará e do Fórum Estadual de Educação do Ceará. Prof. Helder Nogueira Andrade Professor Efetivo da Rede Pública Estadual de Ensino do Estado do Ceará. Doutor em Ciências Sociais (UFRN); Mestre em Ética e Filosofia Política (UECE); Especialista em Gestão e Políticas Públicas (FESPSP/Fundação Perseu Abramo; Historiador (UFC). Atualmente é membro da Direção Nacional da CUT; Vice-Presidente da CUT-Ceará; Vice-presidente do SINDIUTE; Secretário Estadual de Organização do PT-Ceará; Membro efetivo do Conselho Estadual do Trabalho no Ceará e do Fórum Estadual de Educação do Ceará.

O conceito de governo possui muitos sentidos e possibilidades. Em linhas gerais, podemos assumir aqui características básicas para uma definição simples: o exercício do poder do Estado; atribuição constitucional do poder executivo sobre uma sociedade; posse de caráter transitório; ascensão ao poder por meio de eleições livres e periódicas (no caso das democracias); conjunto de órgãos administrativos; e posse de ordem jurídica.

​No último dia 26 de setembro, o governo Bolsonaro cravou seus 1.000 dias de inexistência. O período pode ser compreendido como dias de solidão. Explico: o presidente (executivo) eleito para governar decidiu se manter afastado de suas atribuições precípuas, especializou-se no simples esvaziamento do conceito, seguiu o seu populismo radical, priorizou uma contínua produção de crises, instabilidade, polêmicas e um contínuo desmonte das capacidades inerentes ao poder executivo.

A prioridade do período foi o desmonte da capacidade do governo para garantir sua própria existência, seja na ordem jurídica, com a “boiada passando” na legislação ambiental, que levou à elevação brutal das queimadas na Amazônia, seja no aparelhamento da Polícia Federal para conter investigações contra a família. A incompetência também se mostrou evidente nas atrapalhadas dezenove trocas ministeriais e nos cortes orçamentários, que, no caso da educação, seguem o rumo da inviabilização do funcionamento das escolas e universidades.

​A tragédia nacional expressa em quase 600 mil mortos nos dois anos de pandemia no país igualmente evidencia a solidão de um povo, abandonado à própria sorte, sem governo, sem governante, sem coordenação federativa, com políticas públicas desmontadas e instituições governamentais confusas e esvaziadas pela incompetência e irresponsabilidade como projeto (des)governamental.

​Os resultados retumbantes desses 1.000 dias de Bolsonaro são, em síntese, um profundo caos social. São mais de 14 milhões de desempregados, cerca de 19 milhões passando fome e 14,7 milhões na extrema pobreza. O descontrole inflacionário ataca brutalmente as condições de sobrevivência do povo brasileiro. Nos últimos 12 meses (até julho/2021), a cesta básica na cidade de Fortaleza subiu 16,65%, ou seja, o consumidor da capital cearense precisa gastar 53,23% do salário mínimo (R$ 1.100) para acessar uma cesta básica. Lembremos que, no Brasil, mais de 14 milhões de famílias de cidadãos vivem na extrema pobreza, ou seja, com até R$ 89 per capta mensal.

​O povo brasileiro está fraturado. O que podemos definir como padrões mínimos de unidade nacional de cidadania, conforme previsão constitucional, nas três dimensões básicas dos direitos civis, sociais e políticos, sofre um perigoso esgarçamento do tecido social.

Num país profundamente desigual, que atinge níveis recordes de exclusão social, no limite, com a evidente mazela da fome como uma verdadeira epidemia, o protagonismo do governo federal, sob a égide do federalismo cooperativo, como indutor do desenvolvimento inclusivo, torna-se uma exigência vital.

O país está despedaçado, com cada ente federado buscando seu caminho solitário para desenvolver a capacidade de governar. Nas questões nacionais decisivas, como a política de combate à pandemia, a política educacional, a política econômica e a política de proteção social, a regra foi o desmonte governamental no âmbito federal.

Os governos municipais e estaduais precisaram entrar na Justiça por mais vacinas para combater a pandemia. Tiveram de decidir de forma fragmentada as medidas para conter a evasão escolar e a exclusão educacional, sem contar que lidam com o cotidiano de contínua elevação dos índices de inflação e das taxas de juros, combinadas com o aprofundamento da estagnação econômica.

O povo brasileiro está cansado das fraturas sociais que destroem direitos e da solidão federativa que se desdobra na inexistência do governo federal em suas atribuições constitucionais precípuas. O país despedaçado pela desigualdade e exclusão está exaurido, sem estabilidade política e mergulhado em profunda crise econômica.

No dia 02 de outubro, precisamos ir às ruas. Exercer o direito democrático da livre manifestação contra a tirania de um governo inexistente por 1.000 dias. Seguiremos em marcha contra o odioso projeto de desmonte governamental bolsonarista. É preciso retomar o rumo de um governo indutor da esperança.       

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