Sexta, 19 Julho 2024 11:08

Destaques do FGTS em 2023

Clovis Scherer Economista do DIEESE e assessor da CUT no Grupo de Apoio do Conselho Curador do FGTS Clovis Scherer Economista do DIEESE e assessor da CUT no Grupo de Apoio do Conselho Curador do FGTS
 

 

 Publicado: 18 Julho, 2024 - 00h00 | Última modificação: 18 Julho, 2024 - 11h12

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço é uma poupança de cada trabalhador e trabalhadora que tem contrato pela CLT. Trata-se do maior fundo de financiamento privado do Brasil e da América Latina, com R$ 700 bilhões em ativos, que financia a habitação popular, obras de saneamento e de transporte urbano, que dá acesso à casa própria e que protege o trabalhador que é demitido, que se aposenta ou que sofre uma doença grave.  A boa notícia é que, em 2023, o FGTS cumpriu a contento todas essas funções e ainda teve um resultado financeiro excelente.

O Relatório de Gestão recém publicado mostra que o Fundo executou um orçamento anual recorde, de R$ 102 bilhões, com quase R$ 90 bilhões aplicados para financiar a habitação popular. Os financiamentos atenderam 454 mil famílias nas linhas para a habitação popular (renda até R$ 8.000 mensais) e outras 39 mil na linha para cotistas, sem limitação de renda. Além disso, os saques das contas vinculadas destinados à compra ou pagamento do financiamento da casa própria atingiram outros R$ 23 bilhões em 2023. Esses números dão uma noção da grandeza das aplicações dos recursos do Fundo, que não ficam parados num cofre de banco, mas se convertem em obras, emprego e crescimento econômico.

Ao mesmo tempo, o Fundo sustentou 20,5 milhões de saques das contas por motivo de demissão sem justa causa do trabalhador, com retiradas totais de R$ 62 bilhões. A quantidade de pessoas beneficiadas e o valor sacado são bem maiores, por exemplo, do que os números do programa Seguro Desemprego.

As finalidades sociais do Fundo não o impediram de obter o maior lucro da história, de R$ 23 bilhões. As receitas foram de R$ 61,5 bilhões no ano, metade decorrente dos juros dos empréstimos e a outra metade de rendimentos e valorização de papéis e outros ativos. As despesas foram de R$ 38,1 bilhões, a maior delas sendo crédito mensal nas contas dos trabalhadores e que somou R$ 26 bilhões. Além disso, o Fundo concedeu R$ 8,7 bilhões em subsídios à 325 mil famílias de baixa renda (até R$ 4.400 mensais) para a compra e pagamento dos juros no financiamento da casa própria.

No que interessa diretamente ao cotista, detentor dos recursos do Fundo, as contas tiveram rendimento de 4,76%, em 2023, pouco acima dos 4,62% de inflação medida pelo IPCA-IBGE. Até agosto o Conselho Curador do FGTS vai definir a parcela do lucro de R$ 23 bilhões que será distribuída aos cotistas, o que fará o rendimento total das contas atingir ganho real expressivo no ano.

Um dos fatores que contribuiu em muito para o resultado de 2023 foi o acordo firmado com a Prefeitura do Rio de Janeiro em torno do Fundo de Investimentos do Porto Maravilha, que é do FGTS. Com esse acordo, os direitos do Fundo na área se revalorizaram e contribuíram com R$ 6,5 bilhões para o resultado global das contas.

Outro destaque do ano passado foi o importante salto tecnológico representado pela fase final de desenvolvimento FGTS Digital, e que entrou em operação em 2024. Com esse novo sistema que integra o recolhimento das contribuições para o fundo ao e-Social e aos sistemas dos órgãos de fiscalização, espera-se reduzir a sonegação e a inadimplência de modo a garantir aos trabalhadores o efetivo direito ao depósito no Fundo.

Porém os números mostram que há ameaças à sobrevivência do equilíbrio e bons resultados do Fundo no longo prazo. Um deles é o crescimento explosivo do empréstimo do saque aniversário, em 2023, de 34% em relação ao ano anterior. Essa modalidade de saque, hoje a segunda em valor, está sendo utilizada abusivamente por empréstimos que transformam a poupança em simples complemento de renda para consumo imediato. Os bancos, que lucram muito com esse tipo de empréstimo, fazem propaganda maciça, e os trabalhadores muitas vezes não percebem que estão comprometendo a proteção ante a demissão sem justa causa, um pecúlio para a aposentadoria, recursos para enfrentar uma doença grave e a formação de poupança para a casa própria.

Os trabalhadores e trabalhadoras têm, no FGTS, uma ferramenta poderosa para atingir objetivos sociais e econômicos de grande importância para eles próprios e para todos os brasileiros. Mas como tudo que é grande e valioso, desperta o interesse e a cobiça pelo seu controle, especialmente quando o capitalismo financeirizado converte tudo em operações de curto prazo, em detrimento de objetivos sociais maiores.

Clovis Scherer

Economista

Subseção DIEESE/CUT

Membro do Grupo de Apoio Permanente ao Conselho Curador do FGTS

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