Terça, 18 Abril 2023 10:21

A economia e os primeiros cem dias

Por Adhemar S. Mineiro Por Adhemar S. Mineiro

Por toda parte se avaliam os primeiros cem dias do novo governo. Vamos então falar aqui um pouco dos primeiros cem dias na área da economia. Como em outras áreas, aqui as análises se moveram entre as expectativas de novos ares e da volta do crescimento, de um lado. E de outro lado, dos vaticínios do descontrole e do aprofundamento da crise. No fim das contas, nem uma coisa e nem outra. O problema é que o país precisa achar rápido o rumo do crescimento econômico e da geração de emprego e renda, caso contrário, a crise social vai se aprofundar, e as consequências políticas virão à galope.

Evidente que a prioridade do início de governo não foi necessariamente econômica. Até porque, por um lado, a aprovação da chamada “PEC da Transição” ainda em dezembro, entre a vitória eleitoral de Lula e a posse do novo governo, garantiu espaço para gastos sociais básicos que estavam na proposta do governo eleito. Isso evitou um tensionamento de começo de governo em torno de uma disputa orçamentária que seria de vida ou morte para o novo governo. E também sinalizou que haveria espaço de conversa com o Legislativo, tranquilizando um pouco as coisas em relação ao perigo de impasses.

Por outro lado, os acontecimentos de 8 de janeiro colocaram o foco na temática democrática e na defesa da institucionalidade constitucional criada desde 1988. A tentativa de um possível golpe – capitaneado por bolsonaristas que se recusavam a acatar o resultado eleitoral e insistiam em fazer uso de métodos golpistas, confrontando os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com um chamamento permanente à entrada dos militares e outras forças de segurança auxiliares no cenário político – fez com que os democratas e os três poderes cerrassem fileiras em torno da defesa da ordem democrática, o que virou estratégia de sobrevivência. Assim, até que a turbulência acalmasse, a estabilidade democrática ficou sendo a prioridade.

Com a poeira baixando, começamos a ter uma cobrança quanto aos rumos da economia, voltando em parte ao debate que se deu no fim do ano quanto à trajetória econômica. De um lado, a visão financista arraigada, associada ao fiscalismo, focando em elementos de “terror econômico” (disparada do dólar, explosão inflacionária, queda da Bolsa – esta última inclusive movida por crise financeira das empresas, como a das Americanas e, no cenário internacional, a crise econômica da vizinha Argentina que poderia nos arrastar, e as turbulências financeiras internacionais, com a quebra de bancos e os programas de socorro). Essa visão acabava privilegiando cautela fiscal e política de juros altos, buscando segurança para os capitais financeiros.

Por outro lado, apenas os gastos sociais já negociados com o Congresso não estão sendo suficientes para dar “tração” à economia brasileira. Assim, existe a necessidade de demanda na veia, aumento de gastos e investimentos públicos de forma a impulsionar a economia e sair do marasmo em que nos deixou o governo anterior.

É fundamental uma resposta rápida, pois sem a geração de renda e emprego, a crise social herdada vai se aprofundar, e os impactos políticos podem ser de desestabilização da base costurada pelo governo atual no Congresso. Isso abriria caminho para aproximar a crise social de uma crise política, e também, para o crescimento de uma oposição golpista ao governo em curso. O país precisa urgentemente de investimentos em infraestrutura para poder voltar a crescer, e precisa, a partir dos compromissos internacionais que tem assumido, acelerar a transição no rumo de uma economia de baixo carbono, o que também demanda um volume grande de investimentos para progredir.

Os movimentos mais recentes na área econômica, entretanto, estiveram longe de operar com uma visão clara de onde se quer chegar. Enquanto de um lado setores do governo, incluindo aí o próprio presidente da República, bateram duro na política de juros altos do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central), na direção do BC autônomo, e até nas rígidas metas de inflação adotadas, de outro o ministro da Fazenda adotou um discurso fiscal bastante conservador, na linha da austeridade. Apresentou uma proposta de “novo arcabouço fiscal” com freios ao crescimento dos gastos (aparentemente, com uma preocupação maior de alterar o chamado “teto de gastos” do que efetivamente de poder gastar mais para viabilizar o crescimento econômico). Assim, ao menos no curto prazo, ficam inviabilizados os investimentos robustos necessários a uma retomada sustentada do crescimento da renda e do emprego no país.

Pode ser que outros elementos entrem nesta equação. Por exemplo, existe uma viagem em curso de altas autoridades brasileiras, presidente da República incluído, à China nesse momento, e isso pode viabilizar acordos de investimento em infraestrutura que sejam capazes de dinamizar a economia. Mas, a menos que essa ou alguma outra surpresa aconteça, as definições que temos até aqui parecem longe de evitar que a economia siga patinando, sem achar um rumo claro de retomada. E esse cenário, como levantado anteriormente, pode vir a cobrar um preço político que não pode ser estimado como pequeno para a situação pela qual estamos passando no país.

Mídia