Sexta, 13 Janeiro 2023 10:28

Relatório do Ministério da Cultura detalha obras que foram danificadas

 (crédito: Mariana Lins/CB/D.A Press)
(crédito: Mariana Lins/CB/D.A Press)

A ministra da Cultura, Margareth Menezes, divulgou, nesta quinta-feira (12/1), o relatório preliminar com levantamento sobre os danos causados ao patrimônio público durante os ataques do último domingo. Elaborado por técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e dividido em quatro partes, o documento faz um detalhamento dos bens móveis e imóveis danificados e traz fotografias do que foi depredado durante as manifestações antidemocráticas. "O prejuízo foi muito grande. A continuação desse trabalho vai demandar alguns meses", disse a ministra, em coletiva realizada na tarde de ontem.

Segundo Leandro Grass, que vai assumir a presidência do Iphan, o relatório é contundente e foi feito em tempo recorde. É o primeiro documento que dá conta dos seis espaços danificados: Palácio do Planalto, Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal (STF), Museu da Cidade, Espaço Lucio Costa e Praça dos Três Poderes. "Não vamos medir qualquer esforço para fazer a recuperação daquilo que possa ser recuperado e também permitir que a gente faça um processo de memória e reparação da democracia brasileira", disse. O trabalho será feito em conjunto por vários órgãos federais e locais. Para organizar esse processo de recuperação e restauro, a ministra Margareth Menezes propôs à Presidência da República, sob indicação do Iphan, a criação de uma comissão para definir e coordenar as ações.

Segundo o relatório, não há bens móveis nem imóveis que sejam irrecuperáveis entre as obras e o patrimônio danificados, mas alguns podem exigir mais esforço que outros, caso do relógio Balthazar Martinot confeccionado pelo relojoeiro de Luís 14, uma peça do século 17, presente da corte francesa para Dom João VI. Grass explica que algumas obras têm valor inestimável e não é possível estabelecer uma estimativa. "De maneira geral, a gente tem uma leitura que a maioria dos danos são reparáveis. Nossa leitura é que a maioria dos bens imóveis são reparáveis", explicou Maurício Goulart, coordenador técnico substituto da superintendência do Iphan.

A comissão sugerida pela ministra será presidida pela arquiteta Jurema Machado, ex-presidente do Iphan e ex- coordenadora de Cultura da Unesco no Brasil, e reunirá órgãos do governo federal numa força-tarefa que pode se ampliar para instituições do poder público local, como a Secretaria de Cultura do Distrito Federal, e para possíveis colaborações externas. "De segunda para cá, o Ministério da Cultura (MinC) e o Iphan receberam muito apoio técnico, não vai faltar energia, esforço e colaboração", disse Grass.

Os técnicos do Iphan visitaram todos os prédios invadidos e depredados durante os ataques para poder confeccionar o relatório. Segundo Goulart, a recuperação será feita em várias etapas. A primeira delas, que já está em curso, é a reposição de vidros e o reparo do chão e do forro. Para esses, há previsão nos contratos de manutenção predial de alguns órgãos, embora essa previsão não dê conta da enorme demanda resultante da quebradeira. É o caso também de parte do mobiliário do Congresso Nacional.

O Iphan ainda não fala em números tanto para o prejuízo financeiro quanto para a quantidade de obras danificadas, assim como não projeta uma estimativa de tempo para os restauros. "Ainda não há estimativa financeira de quanto vai custar", avisa Maurício Goulart. "Não sabemos o valor nem o tempo exato." Ele lembra que nem todos os bens são tombados como patrimônio material. O tombamento vale para o conjunto arquitetônico, mas boa parte dos bens móveis não entram nessa lista e muitos deles já foram recolhidos para avaliação. O relatório descreve o que foi encontrado, dá um quadro geral dos danos com registro fotográfico e servirá de guia para dar os próximos passos, além de conter uma lista de ações emergenciais.

Algumas delas são de médio prazo e demandam a elaboração de projetos mais detalhados. "As obras de arte têm valor incalculável e técnicas específicas para recuperação e apenas num segundo momento a gente vai ter a resposta sobre a reversibilidade ou não dos danos a esses elementos", garantiu Goulart. Segundo Leandro Grass, algumas dessas obras já foram, inclusive, encaminhadas para restauro. O relatório aponta, por exemplo, que o dano a uma pintura sobre madeira da Bandeira do Brasil, de autoria de Jorge Eduardo Rel, tem danos que podem ser irreversíveis. Em As mulatas, de Di Cavalcanti, há perfurações, abrasões e arranhões que podem ter sido feitos com pedaços de pedra portuguesa.

Também ainda não há definição quanto à origem dos recursos para os restauros. Assim como parte da reposição do mobiliário e vidros podem vir de contratos de manutenção existentes, os próprios órgãos, que têm orçamento para isso, também poderão custear parte dos restauros, mas Iphan e MinC não descartam doações e outras fontes. O piso da Praça dos Três Poderes é responsabilidade da Secretaria de Cultura do Distrito Federal, assim como o Museu da Cidade. "À medida que a gente for aprofundando as necessidades, cada órgão vai arcando com seu papel, inclusive orçamentário", explicou o técnico. "Tivemos muita oferta de ajuda de profissionais do mundo inteiro e a ideia é que esse grupo de trabalho possa coordenar esse esforço."  Uma das opções de recurso descrita no relatório é o Fundo Patrimonial Mundial, que prevê modalidade de assistência emergencial de até US$ 75 mil.

Questionado sobre a possibilidade de os autores da depredação pagarem pelos danos, Maurício Goulart lembra que isso vai depender de decisão judicial. "Se o Judiciário entender que determinados responsáveis podem arcar, obviamente isso pode ser direcionado, mas ainda não se sabe se isso será possível ou não", disse.

Ajuda externa

A Organização das Nações Unidas para a Ciência e a Cultura (Unesco) foi uma das instituições internacionais que se prontificou a apoiar as ações de restauro e recuperação dos danos causados pelos ataques. Diretora representante da Unesco no Brasil, Marlova Noleto entrou em contato com o Ministério da Cultura para oferecer a ajuda da instituição. "O que conversei com a ministra Margareth Menezes é que a Unesco pode apoiar de todas as maneiras a recuperação para fazer o restauro e as alterações necessárias. Vamos trabalhar em conjunto", disse. "A partir do relatório, vamos definir os próximos passos."

A Unesco trabalha em cooperação técnica especializada com um conjunto de especialistas com experiência de restauro e reconstrução no mundo inteiro. "Em geral, o que se faz nesse tipo de situação é que existe a união de esforços com recursos públicos, privados e da Unesco com presença de especialistas", explicou. Marlova lembra que a destruição atingiu o conjunto arquitetônico tombado como patrimônio da Unesco, em 1987.

 

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