EXPEDIENTE DO SITE
Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Publicado: 27 Junho, 2022 - 08h30 | Última modificação: 27 Junho, 2022 - 08h40
Escrito por: Rosely Rocha | Editado por: Marize Muniz
No auge da pandemia, em 2020, as empresas brasileiras demitiram 825,3 mil trabalhadores formais. Deste total 593,6 mil postos de trabalho eram ocupados por mulheres. Ou seja, dos postos fechados, 71,9% eram ocupados por trabalhadoras, muitas delas mães solo, chefes de família.
Entre 2019 e 2020, o número de trabalhadoras ocupadas caiu 2,9%, de 20,7 milhões para 20,1 milhões, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esses números não surpreendem quem passa por essa situação de desemprego muito menos quem estuda o mundo do trabalho. Em todas as crises econômicas as mullheres são as primeiras a serem demitidas e as últimas a conseguirem uma recolocação no mercado de trabalho. E a saída para elas é fazer bicos para sustentar a si e a família.
Este é o caso de Julia Margarida Gomes da Silva, de 38 anos, divorciada, mãe de três filhos e recém-formada em técnica de enfermagem. Enquanto procura um emprego formal, que garanta direitos como férias, 13º salários e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), ela tem sobrevivido com empregos temporários, substituições em folgas, enfim, fazendo um pouco de tudo.
“Já fiz bordados, fui cuidadora de idoso e faxineira, tudo para colocar o arroz na panela pros meus filhos”, conta Júlia, que só teve emprego com carteira assinada como auxiliar de serviços gerais, vendedora de loja de roupas e cozinheira.
Segundo ela, quem ajuda a pagar as contas são a sua mãe e o padrasto, ambos aposentados, porque a pensão das suas duas filhas, de 16 e 14 anos, é de R$ 1.300 e o valor do aluguel é R$ 900. O pai do seu caçula, de sete anos, não assumiu o filho e foi morar no exterior, e ela diz que não tem como encontrá-lo.
“Eu nunca fui incentivada a estudar pelo meu ex-marido, apesar dele ser professor. Antes eu trabalhava na delegacia do trabalho em Belém, mas depois da licença maternidade e da transferência dele para o interior do Pará, a desculpa de sempre era que eu tinha de cuidar dos filhos. Me casei aos 19 anos e somente quando me divorciei voltei a estudar, e para isso sai do Pará e vim para São Paulo há nove anos”, conta.
A luta de Júlia é o retrato de um problema estrutural e histórico. As mulheres, mesmo em ciclos econômicos mais expansivos são as menos procuradas para ocupar vagas de trabalho, afirma a economista e pesquisadora do mercado de trabalho, Marilane Teixeira.
“São vários os fatores, a começar pela a ausência do Estado e da garantia de políticas públicas como creches e ensino integral. Somente no ano passado, 70% das crianças mais pobres, de zero a três anos, estavam sem vagas em creches. Isso é um problema gigantesco para as mulheres que precisam trabalhar”, diz a economista.
Outra dificuldade comum entre as mulheres que precisam deixar seus filhos em creche, é que elas procuram trabalho perto de suas casas para dar tempo de levar e buscar seus filhos em horários compatíveis com sua carga horária.
Segundo Marilane Teixeira, a pandemia reforçou essa situação de desemprego entre as mulheres com o aumento da sobrecarga de trabalho dentro de casa. São elas que normalmente cuidam dos enfermos, das crianças e dos idosos; uma situação que se agravou com o abandono da política de cuidados dos dois últimos governos.
Além desse problema estrutural, o tipo de emprego que vem se recuperando na economia acaba absorvendo o sexo masculino, como a construção civil, composta por 90,6% de homens. A alta no setor foi de 4,3% no contingente de assalariados (mais 80,8 mil).
As mulheres eram maioria nos setores de educação (66,9%); alojamento e alimentação (55,7%) e outras atividades de serviços (52,9%), os mais prejudicados pela pandemia. O segmento com a maior queda de assalariados foi alojamento e alimentação: -19,4% (ou menos 373,2 mil).
“Como as mulheres estão inseridas em atividades que ainda apresentam dificuldades em serem retomadas, como os serviços, a educação, e o trabalho doméstico, a tendência é a mulher ter mais dificuldade em se recolar no mercado”, afirma a economista.
“No auge da pandemia foram perdidas quase 1 milhão de vagas de trabalhos domésticos”, complementa Marilane.
A secretária da Mulher Trabalhadora da CUT Nacional, Juneia Batista, concorda que as mulheres encarregadas de cuidar dos filhos e pais idosos, imposição do modelo de sociedade patriarcal em que vivemos, são as mais prejudicadas.
“Veja o exemplo da Júlia, casou jovem, teve filhos e somente quando conseguiu se divorciar voltou a estudar e trabalhar. Milhares de mulheres vivem situação idêntica. Para mudar isso, é preciso políticas públicas que atendam as mulheres trabalhadoras”, diz Juneia.
A dirigente defende que o empoderamento feminino, se dará por meio da educação e da formação, com reflexos no mundo do trabalho.
“Eu acredito que a mudança do comportamento vem pela educação, pela formação, com igualdade de oportunidades para homens e mulheres no mercado de trabalho”, finaliza Juneia Batista.
Outros dados da pesquisa do IBGE
- De 2019 para 2020, o número total de trabalhadores assalariados em empresas e outras organizações ativas caiu de 46,2 milhões para 45,4 milhões, (1,8% a menos).
- A participação feminina entre os assalariados das empresas formais do país caiu de 44,8% para 44,3%, em 2020. É a menor porcentagem desde 2016, ano em que houve o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff.
- Entre os homens, a redução de empregos foi menor, de 0,9%. O número de assalariados recuou de 25,5 milhões para 25,3 milhões. Isso significa que os homens perderam 231,7 mil postos, o equivalente a 28,1% de todas as vagas encerradas à época.