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Projeto de Lei 591 está parado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e, na avaliação dos trabalhadores dos Correios, pode não ir a votação em 2022
Publicado: 07 Fevereiro, 2022 - 08h49 | Última modificação: 07 Fevereiro, 2022 - 08h56
Escrito por: Cláudia Motta, da RBA
Uma das pautas quentes do ano legislativo é a privatização da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). O Projeto de Lei 591 está parado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado e, na avaliação dos trabalhadores dos Correios, pode não ir a votação em 2022.
“Nós acreditamos nisso por se tratar de ano eleitoral. E uma pauta polêmica da natureza que é a privatização de uma empresa presente em todos os 5.570 municípios do país bem avaliada pela população na sua maioria é difícil de seguir adiante”, afirma o secretário de Imprensa da federação dos trabalhadores dos Correios (Fentect), Emerson Marinho.
“O governo terá muita dificuldade de conseguir, em ano eleitoral, fazer com que essa pauta ande dentro do Senado. Porque na Câmara já andou, e a galope, pela postura do Arthur Lira”, critica.
O dirigente avalia que no Senado as coisas são diferentes. “E mesmo com a criação de uma força tarefa para fazer com que a pauta ande, na quinta-feira (3) o próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que acha difícil em ano eleitoral a agenda de privatização dos Correios se concretizar”, relata.
“Mas é claro que a gente sabe do poder das emendas do relator, do poder de articulação do governo para tentar implementar não só a pauta da privatização dos Correios como as outras reformas: reforma tributária, a PEC 32. Então estamos vigilantes.”
Alterações insípidas
O relator mencionado é o senador Marcio Bittar (PSL-AC). E entre as alterações propostas ao projeto incluiu um prazo mínimo para agências dos Correios continuarem abertas em municípios com menos de 15 mil habitantes em áreas remotas da Amazônia Legal. A região engloba 772 municípios, considerando todos localizados nos estados de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará, Amapá, Tocantins, Mato Grosso, além de parte dos municípios do Maranhão. A proposta de Bittar prevê o funcionamento dessas agências por 60 meses após a privatização da estatal, segundo reportagem da Agência Brasil.
No entanto, para Marinho, essas alterações são muito inconsistentes. “Ele traz uma falsa garantia de que agências ficariam abertas pelo prazo de 60 meses, ou cinco anos, para atender essa população sem que o concessionário pudesse fechar. Nós já fizemos alguns estudos e isso com certeza não acontecerá. Além de representar 12% dos municípios. Uma quantidade muito pequena diante do serviço que o Correio presta em todo o Brasil.”
Marinho critica ainda não se falar nada sobre os estados do Norte e Nordeste. “Temos áreas muito carentes, com total abandono do Estado. E inclusive no Sudeste, no Sul”, afirma. “Na minha realidade, no Rio de Janeiro, se pegar o município de Caxias, que é muito grande, tem agência de Correio no Centro. Nos bairros periféricos, onde hoje é garantido agência dos Correios, não teria. E a população teria de se deslocar cerca de 20 a 30 quilômetros para poder ter acesso.”
Apagão postal
O representante dos trabalhadores dos Correios considera uma maquiagem muito mal feita as alterações de Bittar em seu relatório. “O senador cumpre a tarefa que lhe foi dada como subalterno desse governo de tentar enganar a população dizendo que continuará assistida”, afirma.
“Fato é que fica muito claro com as privatizações que aconteceram recentemente tanto em Portugal como em boa parte do Canadá, onde agências foram fechadas. Setores de distribuição de carta foram fechados e as pessoas demoram até sete dias para ter uma correspondência. E isso se for de caráter de urgência, ou seja, expressa. Se não, ficam até um mês sem correspondência. É um apagão postal”, avisa, reforçando a necessidade de ampliar o debate sobre o prejuízo que vai ser causado caso a privatização dos Correios seja aprovada no Senado.
Emerson Marinho destaca também outros serviços prestados pela instituição e que, segundo ele, a população ficará sem, caso as agências não estejam mais em funcionamento em determinadas localidades. “A entrega nacional de livros didáticos através do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). Nós temos um convênio. Só se inicia o ano letivo após a entrega. Quando estava nas mãos do setor privado, de empresa de logística, chegava ao final do ano era quando os estudantes estavam recebendo os livros”, diz, como estudante de escola pública.
“Cansei de receber livro didático depois da metade do ano. Com os Correios, a operação começa em outubro e quando é janeiro se encerra. Ou seja, antes do início do ano letivo todas as escolas do país têm condição de entregar aos seus estudantes”, afirma, lembrando ainda a entrega de medicamentos aos municípios e as provas do Enem dentre serviços prestados pelos Correios.
Refém do setor privado
Para o secretário de Imprensa da Fentect, além do risco de sofrer um apagão postal, o Brasil ficaria refém de empresas de logística com uma ECT privatizada. “Como a que faz a entrega das vacinas e ficava toda hora querendo fazer adendo no contrato para receber mais diante da demanda que a população tinha e a pressa de receber as vacinas”, critica.
“Os Correios, por serem empresa pública têm na natureza da sua criação a prioridade de servir à população. É dentro desses aspectos que esse relatório do senador Márcio Bittar se torna maquiado para enganar os senadores e consequentemente a população. Não haverá garantia da universalização postal (como é hoje) se esse projeto passar. E duvido muito que uma empresa privada queira comprar uma concessão onde ela tenha de manter uma agência deficitária por cinco anos. Por exemplo, lá em Laranjal do Jari (no Amapá), onde só tem uma agência dos Correios e não dando lucro. Ela vai fechar”, avisa, manifestando seu repúdio ao relatório e ao projeto de privatização.
“Um projeto contra a soberania e contra a integração nacional que quer acabar com uma empresa pública de 358 anos que liga o país de ponta a ponta e presta serviço social relevante à população brasileira.”
Visibilidade do debate
A estratégia de mobilização no Senado e ampliação do debate são, para Emerson Marinho, a razão pela qual o PL 591 não avançou no Senado. “Tivemos em 2021 uma tarefa muito difícil que foi combater o avanço dessa agenda ultraconservadora e entreguista do governo Bolsonaro. Na Câmara, o Congresso comandado por Arthur Lira ignorou todos os preceitos legais e também o debate com a população. Assim, fez com que em apenas uma votação se aprovasse na Câmara o projeto 591 que abre as portas para a privatização dos Correios”, denuncia. “Já no Senado, estabelecemos um diálogo com a liderança do PT, representada pelo senador Paulo Rocha. Depois de algumas discussões tiramos algumas estratégias de forma a dar mais visibilidade a esse debate.”
A influência dos parlamentares do Partido dos Trabalhadores junto a outros senadores, inclusive do Centrão, foi muito importante para ampliar esse debate, relata Emerson Marinho. “Dialogamos com Renan Calheiros, Eduardo Braga, do MDB, sobre o grande prejuízo que seria para a nação brasileira essa privatização. Diante disso, o Senado começou a se comportar de maneira a rejeitar esse projeto aprovado por Lira a toque de caixa.”
E foi fundamental também, segundo ele, a construção de um comitê de defesa dos Correios, criado pela Federação Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telégrafos (Fentect). “Assim, se dialogava diariamente com esses senadores apresentando informações de forma a subsidiar o debate do por que os Correios deveriam continuar como públicos.”
O dirigente ressalta essa atuação fundamental para que o governo não conseguisse concluir em 2021 a privatização dos Correios.
Pressão governista
Marinho comenta ainda a participação do ministro das Comunicações, Fábio Faria, pressionando pela privatização da instituição. “Diariamente ele estava consultando seus pares, como os senadores da base bolsonarista, para pressionar o presidente da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), senador Otto Alencar (PSD-BA), de forma a colocar em votação”, lembra. “E por duas vezes foi colocado na ordem do dia, na sessão da Comissão. Mas o governo vendo que perderia a aprovação do relatório comandado pelo senador Marcio Bittar (MDB-AC), pediu pra retirar de pauta.”
Isso, avalia Marinho, demonstrou a boa articulação da bancada de oposição ao governo. “E também dos senadores que defendem os Correios como uma instituição pública do povo brasileiro”, diz, destacando contar neste início de ano legislativo com todos que declararam ser contra a privatização. “Mesmo os que fazem parte da base governista. Alguns deixam muito claro a importância dos Correios nos municípios que não têm a mão do Estado. E o Correio é o único ente do Estado brasileiro garantindo cidadania para aquela população.”