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Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
A Câmara dos Deputados concluiu, nesta quinta-feira 12, a votação da MP 1045, editada pelo governo federal em abril e que institui o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, autorizando a suspensão de contratos e redução da jornada de trabalho, com redução salarial, como forma de tentar ajudar empresas na pandemia.
Entretanto, o relatório do deputado Christino Áureo (PP-RJ) incluiu no texto diversos “jabutis” (emendas estranhas ao tema principal do projeto), através de mais de 400 emendas, transformando-o em uma reforma Trabalhista , inclusive retirando por meio de acordo individual ou coletivo, na emenda 40, a jornada de seis horas dos bancários e reduzindo o adicional das horas extras.
Após a aprovação do texto base do projeto na terça-feira 11, os parlamentares rejeitaram nesta quinta 11 todos os destaques apresentados pela oposição, que pretendia retirar os "jabutis" incluídos no texto pelo relator da MP 1045.
O projeto segue agora para apreciação do Senado. Se aprovado sem alterações, segue para sanção presidencial. Caso seja alterado pelos senadores, retorna para nova apreciação na Câmara dos Deputados.
“A categoria bancária, especialmente atacada nesta MP na sua jornada e horas extras, assim como toda a classe trabalhadora, está mobilizada para evitar que mais este ataque contra os seus direitos se concretize”, enfatiza Ivone Silva, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.
Mais uma vez, em meio a uma pandemia, sem qualquer debate público com a sociedade, o governo Bolsonaro e sua base aliada na Câmara aproveitam para passar mais uma ‘boiada’ de ataques aos direitos dos trabalhadores. Isso através de temas totalmente estranhos à MP, em relatório apresentado menos de 24 horas antes do início da votação em plenário, impondo aos trabalhadores uma nova reforma trabalhista. É a repetição da falsa dicotomia entre empregos e direitos, que já foi desmentida pelos fatos após a reforma trabalhista, aprovada em 2017, que só fez precarizar as relações de trabalho, atacar a organização coletiva dos trabalhadores e seu poder de negociação, e não gerou empregos.”
A emenda 40 prevê que categorias com jornadas especiais (menores que 8 horas), como é o caso dos bancários, podem ter a jornada estendida para 8 horas mediante acordo individual ou acordo coletivo, fixando em 20% o adicional pelas horas extras que passam a compor a jornada normal de trabalho (sétima e oitava horas). Hoje, a legislação determina que a hora extra seja paga com adicional de 50% (segunda a sábado) e 100% (domingos ou feriados).
A emenda - de autoria do deputado Eli Corrêa Filho (DEM-SP) e acatada na íntegra por Christino Áureo - determina ainda que a alteração na jornada pode ser aplicada inclusive após o período de emergência decorrente da pandemia de coronavírus.
“A jornada de seis horas é uma conquista histórica da categoria bancária, que não deve ser alterada. O governo Bolsonaro e sua base aliada no Congresso, diante do fato de que 2022 é ano eleitoral, no qual parlamentares estão menos predispostos a aprovarem matérias que atacam a classe trabalhadora, tentam utilizar a pandemia como pretexto para retirar o máximo de direitos dos trabalhadores já neste segundo semestre de 2021. Querem passar a boiada enquanto podem”, critica a presidenta do Sindicato.
Em nota técnica sobre a MP 1.045, o Ministério Público do Trabalho (MPT) defendeu as jornadas especiais instituídas para algumas categorias, como a dos bancários.
“Ressalta-se, ainda, que o legislador fixou jornadas especiais de trabalho para certas categorias de trabalhadores não por capricho, mas em razão das condições especiais inerentes ao exercício de suas atribuições, com sobrecarga física e mental diferenciadas em relação aos demais. Para tais situações, a previsão legal de jornadas de trabalho reduzidas constitui importante medida de higiene, saúde e segurança do trabalho, contribuindo para a prevenção de doenças físicas e psíquicas”, esclarece o MPT.
Na nota, o MPT também destaca a inconstitucionalidade da redução da hora extra mediante acordo individual ou coletivo. “Ultrapassada a jornada contratada, ainda que não corresponda à jornada máxima legalmente possível de se pactuar, o pagamento do percentual mínimo é imperativo, com base em regra constitucional expressa, inafastável pela legislação ordinária ou pela vontade das partes”, diz.
Entre os diversos “jabutis” inseridos na MP 1045 para atacar os direitos da classe trabalhadora, destacam-se a criação de modelos precarizados de contratação, como é o caso do Priore e do Requip; e a redução da fiscalização de normas trabalhistas;
O texto adicionado a MP nº 1045, cria o Regime Especial de Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip), destinado aos jovens de 18 a 29 anos; sem registro na Carteira de Trabalho há mais de 2 anos, e a pessoas de baixa renda, oriundas de programas federais de transferência de renda.
Por ele a empresa pode contratar um trabalhador por dois anos, sem vínculo empregatício.
Valor pago pelo Requip
O profissional receberá cerca de R$ 550 mensais, ou seja, 50% do valor do atual salário mínimo de R$ 1.100. Neste ano por falta de verba orçamentária, a empresa vai arcar com o total do Requip. Em 2022, a previsão é que o governo pague metade (R$ 275) e as empresas a outra metade, por meio da Bolsa de Incentivo à Qualificação (BIQ). A carga horária será de 22 horas semanais.
O que o trabalhador perde
Sem férias remuneradas (o trabalhador terá direito a um recesso de 30 dias sem pagamento), sem 13º salário, sem Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) ou outro direito trabalhista.
O trabalhador também não terá direito à Previdência. Se quiser contar com tempo de contribuição para sua aposentadoria terá de pagar do próprio bolso como contribuinte individual, que tem alíquotas acima do trabalhador com carteira assinada.
Mais vantagens aos patrões
A empresa por “ contratar” pelo Requip ainda terá benesses do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL). Os patrões poderão deduzir o pagamento da bolsa (BIQ) da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A empresa também poderá reduzir de 30% para 15% o que paga ao Sistema S.
As empresas poderão ter até 15% de seus trabalhadores contratados neste modelo, sem direitos.
O Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore) é destinado à contratação de jovens de 18 a 29 anos e pessoas com idade igual ou superior a 55 anos, sem vínculo formal por mais de 12 meses.
O que o trabalhador perde com o Priore. Não terá direito a 50% dos salários devidos, no caso de demissão do emprego antes do prazo de vigência estipulado no contrato. O valor do salário pago a esses trabalhadores não poderá ultrapassar dois mínimos (R$ 2.200).
A multa sobre o FGTS cai de 40% para 20% e as alíquotas depositadas no Fundo caem de 8% para até 2% (no caso de microempresas), 4% (empresas de pequeno porte) e 6% (demais empresas).
Os trabalhadores contratados por meio do Priore terão direito a receber o Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), com valor equivalente ao salário mínimo / hora. Este bônus será aplicado sobre um quarto do número de horas de trabalho acordadas, limitado ao valor mensal correspondente à duração do trabalho de 11 horas semanais. O BIP será custeado com recursos da União, do Sistema S, do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.
As empresas poderão contratar até 25% do seu quadro funcional neste modelo.
Juntando o Piore (25%) e o Requip (15%) significa que as empresas poderão contratar até 40% de seu quadro funcional por meio desses dois modelos que não pagam sequer um salário mínimo, sem direito a férias e a indenizações trabalhistas.
Pelo texto, uma micro ou pequenas empresa, ou cooperativas, que tenham no local de trabalho até 20 funcionários, só serão autuadas na segunda vez que um auditor encontrar a mesma irregularidade. Se o fiscal descumprir a regra e multar na primeira vez, o auto de infração será anulado.
As regras válidas para a segunda visita não se aplicam aos casos de falta de registro em carteira de trabalho, atraso de salário e não recolhimento de FGTS, fraude e irregularidades diretamente relacionadas a risco grave e iminente à segurança e saúde do trabalhador ou trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil, por exemplo.
Em nota conjunta (leia aqui a íntegra), todas as centrais sindicais repudiaram as mudanças aprovadas na Câmara dos Deputados no texto da MP 1045 “por se configurarem em matérias estranhas ao conteúdo original, constituindo-se em verdadeiros jabutis”.
De acordo com a avaliação das centrais, “as novas medidas de flexibilização laboral e afastamento dos sindicatos das negociações mais uma vez seguem a linha da precarização e aumentarão a vulnerabilidade dos trabalhadores e das trabalhadoras”.
Dentre os principais pontos prejudiciais aos trabalhadores, as centrais sindicais destacaram:
1. Possibilidade de o trabalhador com contrato de trabalho suspenso contribuir como segurado facultativo, conforme as alíquotas estabelecidas para o segurado obrigatório (art. 18 do PLV). É o empregador que deve pagar a contribuição previdenciária, e não o trabalhador, em momento de pandemia e dificuldades financeiras, com redução salarial.
2. Instituição do Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego – Priore. O Programa traz à tona dispositivos da MP 905, MP da Carteira Verde-Amarela. A alteração configura matéria totalmente estranha ao texto original da MP nº 1.045 e não guarda relação alguma com as medidas excepcionais e transitórias contidas na MP.
3. Criação do Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva – Requip e a inclusão do Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário. Também matéria estranha ao texto original da MP. “Embora o objetivo ‘social’ do programa seja relevante, trata-se de um programa que promove a exploração da mão de obra, subvertendo o direito ao trabalho assegurado como direito social pela Constituição.”
4. Alteração de vários artigos da legislação trabalhista atual, recuperando dispositivos da MP nº 905 e da MP nº 927, também matérias estranhas ao texto original da MP nº 1.045. Há graves modificações nas normas que definem gratuidade da justiça, afetando, consequentemente, o direito de acesso à Justiça, fundamental em momento de pandemia e crise econômica, com a ocorrência de muitas demissões. Além delas, alterações substanciais no tocante à fiscalização do trabalho e extensão de jornada.
Por fim, a nota alerta também para a jurisprudência fixada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em relação à inserção de matérias estranhas ao texto original de uma medida provisória.
“Viola a Constituição da República, notadamente o princípio democrático e o devido processo legislativo (arts. 1º, caput, parágrafo único, 2º, caput, 5º, caput, e LIV, CRFB), a prática da inserção, mediante emenda parlamentar no processo legislativo de conversão de medida provisória em lei, de matérias de conteúdo temático estranho ao objeto originário da medida provisória”, decidiu o STF.
O presidente da CUT, Sérgio Nobre e entidades estudantis criticaram o programa, lembrando que por não ter nenhum vínculo com atividades escolares pode afastar o jovem das salas de aula, bem como a recriação da Carteira Verde Amarela, embutida no texto da MP 1045.
*Com apoio do Portal CUT/Rosely Rocha