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Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
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O contrato para a compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin, fabricada pelo laboratório Barath Biotech, foi assinado em 25 de fevereiro sem ter um servidor responsável pela sua fiscalização, o que é exigido por lei. A nomeação da fiscal Regina Célia Silva Oliveira só aconteceu no dia 22 de março.
Portanto, a negociação dos termos do contrato foi feita de forma ilegal pelo governo Bolsonaro, ainda na gestão do general Eduardo Pazuello, que disse obedecer ao que manda o presidente. Bolsonaro, diferentemente dos demais laboratórios, se empenhou pessoalmente nesta contratação, tendo editado Medida Provisória autorizando a contratação de vacinas mesmo sem a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), caso em que se encontrava a Covaxin.
Bolsonaro se comprometeu com o primeiro-ministro da Índia, com a assinatura do contrato. Mesmo sem a autorização da Anvisa e com preço superfaturado, o contrato foi assinado em tempo recorde de três meses. Por sua vez, o líder do governo Ricardo Barros propôs emenda à MP de Bolsonaro incluindo a Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO), da Índia, no rol de órgãos habilitados para dar essa autorização.
Fiscal não viu nada de atípico
O contrato da vacina Covaxin teve todo tipo de fraude, desde o superfaturamento, passando a dose de US$ 1,34 para US$ 15, aumento de 1.000%, valor mais alto pago entre todas as vacinas; foi o primeiro a ser negociado e assinado, sem justificativa plausível, por uma intermediária, a Precisa Medicamentos; a empresa brasileira, por sua vez, tinha como sócia, a Global Gestão em Saúde, processada por receber antecipadamente R$ 20 milhões por medicamentos para doenças crônicas, nunca entregues ao Ministério da Saúde, em 2017, na gestão de Ricardo Barros, líder do governo Bolsonaro, então titular da pasta.
E mais: as primeiras 4 milhões de doses, não foram entregues no prazo (aliás, nenhuma dose da vacina indiana chegou até hoje ao Brasil); fatura enviada ao Ministério da Saúde tratando do assunto, descoberta pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio foi falsificada; o montante de R$ 1,6 bilhão para o pagamento à Precisa foi separado no orçamento do ministério só não sendo pago porque o servidor do setor de importação da pasta, Luis Ricardo Miranda, denunciou irregularidades no contrato em junho à CPI. Antes, em março, uma terceira empresa, a Madison Biotech, que não constava do contrato, uma firma de fachada com sede no paraíso fiscal de Cingapura, tentou receber parte do dinheiro, US$ 45 milhões, em nome do laboratório Barath Biotech. O presidente Jair Bolsonaro sabia das fraudes, e, segundo disse a Luis Ricardo Miranda e ao seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), eram parte do ‘rolo do (Ricardo) Barros” no Ministério da Saúde.
Mas a fiscal do contrato da Covaxin, Regina Célia Silva Oliveira, disse, em depoimento nesta terça-feira à CPI do Genocídio, não ter visto nenhuma anormalidade nos termos do contrato. “Em relação à minha função de fiscal eu não achei nada atípico”, respondeu ao presidente da Comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM).
Para tentar esconder a ilegalidade da negociação e assinatura do contrato sem a presença de um fiscal, Regina foi nomeada em 22 de março deste ano, dois dias após os irmãos Miranda denunciarem a Bolsonaro as fraudes do contrato. Ao mesmo tempo em que tentava dar um ar de normalidade à transação, o presidente não determinou à Polícia Federal, que abrisse inquérito para investigar o esquema que chamou de ‘rolo do Barros”, mostrando que sabia das fraudes.
Mesmo tendo sido alertada das fraudes pelo setor de importação do ministério, a servidora autorizou o prosseguimento do contrato dias após assumir como fiscal. À CPI disse que autorizou ‘apenas’ o que disse ser a sua responsabilidade, que ‘se relacionava à redução do quantitativo de doses’.
Informou que para fazer esta autorização acreditou ‘na boa fé’ da diretora técnica da Precisa, Emanuela Medrades, de que as doses seriam entregues nos meses seguintes. Disse que não sofreu pressão para aceitar a redução da entrega de 4 para 3 milhões de doses e que a decisão de aceitar a mudança foi tomada apenas por ela, e não por qualquer superior seu.
Pressionada pelo relator da CPI, senador Renan Calheiro (MDB-AL) quanto à legalidade da sua decisão, disse que faz parte das atribuições do fiscal do contrato. Mas admitiu não haver amparo legal: “Não tem fundamento legal, é uma decisão do fiscal do contrato”, afirmou.
Disse que não via irregularidade também em relação à presença da empresa Madison Biotech indicada para receber em nome da Barath Biotech, apesar de não constar do contrato. Mas o pagamento não chegou a ser feito, devido à denúncia dos irmãos Miranda.
A fiscal só fez relatório recomendando a suspensão do contrato da Covaxin com a Precisa, em junho, ou seja, somente após a CPI ouvir os depoimentos dos irmãos Miranda, denunciando o esquema de superfaturamento, a participação da fiscal no esquema, informações repassadas em março a Bolsonaro.
Indicada por Barros
Regina negou ter sido indicada pelo ex-ministro da Saúde e atual líder do governo Ricardo Barros para o cargo de fiscal ou qualquer outro cargo de confiança. Acrescentou não conhecer Barros pessoalmente, nem ter recebido dele orientação sobre como tratar contratos de fornecimento de vacinas, nem ter sido indicada por ele para qualquer cargo. Regina Célia insistiu que só conhece o líder do governo na Câmara porque ele é uma pessoa pública.
No entanto, após ser confrontada com documentos pelos senadores, a fiscal de contratos disse ser servidora do Ministério da Saúde desde 1995. Admitiu que foi ‘remanejada’ quando ele era o ministro. A primeira nomeação ocorreu no dia 8 de dezembro de 2016, para um cargo classificado como DAS 2. Depois, em 15 fevereiro de 2018, Regina tornou-se DAS 1, também por Ricardo Barros.