Quarta, 09 Junho 2021 15:17

CPI: mesmo desmoralizado por Bolsonaro, Queiroga manobra para defendê-lo

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), advertiu que a testemunha não poderia mentir O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), advertiu que a testemunha não poderia mentir

Olyntho Contente

Imprensa SeebRio

“Indivíduo que se curva servilmente diante daqueles de quem depende; bajulador, puxa-saco”. Estes são os significados populares dados pelos dicionários brasileiros ao termo ‘capacho’, que talvez pudessem ser aplicados ao atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

Apesar de ser pública e sistematicamente desmoralizado por falas e ações de Jair Bolsonaro contra medidas de combate à pandemia do novo coromavírus, em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Genocídio, nesta terça-feira (8/6), Queiroga cumpriu o papel que lhe foi reservado de manobrar para livrar o chefe da acusação de optar por uma política que negou e nega a gravidade da pandemia do novo coronavóris sendo, assim, investigado de ser o responsável pelo número recorde de contaminados e mortos no Brasil. Segundo médicos da rede federal do Rio de Janeiro ele seria o ‘Pazuello com CRM’, numa referência ao general da ativa que o antecedeu no cargo e que na CPI mentiu e se omitiu de forma humilhante para blindar Bolsonaro.

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM) chegou a lembrar que o ministro não poderia mentir. “O senhor está aqui como testemunha”, advertiu.

Clique aqui para assistir ao resumo do depoimento desta terça-feira, feito pelo site UOL.

Autonomia de mentirinha

Queiroga mentiu ao dizer, como Pazuello, que tem total autonomia para comandar o Ministério da Saúde. Ao fazer isto tentou esvaziar a acusação de que Bolsonaro sempre interviu no Ministério e é quem, na prática, através de um gabinete paralelo, dita a política da pasta relacionada à pandemia, afastando os ocupantes do cago que seguiram as orientações científicas de combate à doença.

Acrescentou que não defende o uso da cloroquina e outros medicamentos; que não existe tratamento precoce para a covid-19; que orienta o distanciamento social, o uso de máscara e a não formação de aglomerações; e que a solução para a pandemia passa obrigatoriamente pela vacinação de toda a população. Todas estas posições do ministro e do Ministério da Saúde foram e continuam sendo desrespeitadas pública e sistematicamente por Bolsonaro, desmoralizando o ministro, e, sobretudo, colocando em risco a vida da população, dando o mau exemplo, levando muitos brasileiros a também contrariar as normas de prevenção e acreditar no tratamento precoce, o que contribuiu ainda mais para propagar a doença.

Ao ser questionado pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL) e pelo presidente da Comissão, Omar Aziz (PSD-AM) quanto ao comportamento de Bolsonaro, mostrou o quanto é submisso, esquivando-se de criticar o presidente. “Eu sou ministro da saúde, não sou censor do presidente”, afirmou Queiroga. Lembrado pelo parlamentar de que o presidente, o principal interessado em que fossem seguidas as determinações do Ministério para o combate à pandemia, as estava ignorando, novamente optou por esquivar-se: “As orientações estão postas, cabe a todos seguir”.

Copa América

Mostrou que, mesmo internamente, é desmoralizado por Bolsonaro. Quando perguntado se o presidente segue as orientações do Ministério nas reuniões no Palácio do Planalto, disse que, quando está com ele, Bolsonaro “na maioria das vezes está de máscara”.
Queiroga também teve sua autoridade relegada a último plano ao admitir que ‘não deu aval’ para a realização da Copa América no Brasil. Mas, em seguida, se esforçou para livrar a cara do presidente de ser o responsável por aumentar o risco de contaminação ao trazer o torneio para cá, num momento de descontrole da doença. “Sem público nos estádios, não teremos risco de aglomeração”, chegou a dizer.

Mas, sempre escorregadio, consertou, para livrar-se de ser responsabilizado pelas contaminações e mortes em função da competição: “Agora, a decisão de realizar ou não, não cabe a mim”, afirmou. Mas voltou a blindar Bolsonaro: “Os protocolos são seguros e se forem cumpridos não haverá risco adicional”. Questionado sobre os mais de 1.600 participantes das 10 delegações e 2 mil jornalistas estrangeiros que pediram credencial para cobrir o evento, o ministro afirmou que os jornalistas também serão obrigados a cumprir os protocolos.

Jogo de cena

O depoimento de Queiroga foi um mar de inverdades, submissão e confissão de que não tem qualquer poder decisório; e de que é desautorizado publicamente pelas ações de Bolsonaro. Neste momento de mobilizações populares crescentes e de investigações da CPI, o ministro recebeu ordens para parecer independente e tomar medidas para encobrir o negacionismo bolsonarista.

Mas este jogo de cena transpareceu durante todo o depoimento, ainda mais quando Queiroga tentou, por diversas vezes, justificar intervenções diretas de Bolsonaro, que contrariavam o repetido discurso da autonomia. Um dos exemplos mais marcantes que comprovam esta estratégia foi a decisão de Bolsonaro de vetar a nomeação da médica infectologista Luana Araújo para a recém-criada Secretaria Especial de Combate à Covid.

Convidada por Queiroga pela sua competência notória, Luana sequer chegou a ser nomeada, por sua posição pública contra posições defendidas por Bolsonaro e pelo gabinete paralelo como o tratamento precoce, por ser ineficaz; em defesa do distanciamento; e da aceleração da contratação de vacinas; além de condenar a contaminação de 70% da população como forma de combate à pandemia, a chamada imunidade de rebanho natural.

Convocada à CPI, a médica afirmou na semana passada que nunca foi informada do motivo do cancelamento de sua nomeação. “O ministro disse que lamentava, mas que meu nome não ia passar pela Casa Civil”, contou. Mas Queiroga que na época anunciou a nomeação com elogios à médica, em seu segundo depoimento tirou a responsabilidade do presidente pelo veto, chamando-a para si.

“O nome de Luana começou a sofrer muitas resistências por causa dos temas que estamos tratando. Então, eu decidi cancelar a nomeação”, afirmou Queiroga. “Não houve óbices formais da Casa Civil e da Segov (Secretaria de Governo). Eu desisti porque vi que o nome dela não estava suscitando o consenso que eu queria”, mentiu.

Procurou minimizar o fato do cargo ter permanecido vago, o que pode ser visto como mais um fato a demonstrar o total desinteresse do governo no combate à pandemia. Outro fato que confirma este desinteresse é a inexistência de um médico infectologista em todo o Ministério da Saúde, em plena pandemia. “O ministério enfrenta um esvaziamento de cargos. Mas isto não prejudica o combate à pandemia. Temos consultores nesta área”, tentou minimizar.

Na CPI surgiu outra comprovação de que não é verdadeira a sua alegada autonomia: a manutenção da médica Mayra Pinheiro em cargo de importância no ministério da Saúde, apesar de sua defesa pública do uso da cloroquina, do qual o ministro discorda.

Cloroquina e vacina

O ministro evitou criticar Bolsonaro por orientar o tratamento precoce com a cloroquina. O senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP), vice-presidente da CPI, perguntou se o ministro receitaria cloroquina a seus pacientes. “Estou aqui como ministro de Estado de Saúde”, respondeu Queiroga. Rodrigues perguntou ainda se Queiroga encontrou 4 milhões de comprimidos de cloroquina estocados no ministério quando assumiu. “Não sei. Não me deparei para verificar os estoques deste fármaco”, disse Queiroga.

O governo recusou pelo menos 11 propostas de compra de vacinas de diversos fabricantes desde o início da pandemia, e o atraso do início da vacinação no Brasil também é um dos pontos principais dos senadores durante a CPI. Mas o ministro não quis falar sobre as declarações feitas por Bolsonaro contra a compra dos iminizantes o que aumentou o número de contaminados e mortos pela covid-19.

Na abertura da sessão, o ministro Marcelo Queiroga repetiu que a prioridade dele é vacinar toda a população e que o cenário da pandemia no país é preocupante. Disse que vacinaria até o fim do ano toda a população. Questionado pelo senador Randolfe, admitiu que o Brasil ainda não tem vacina suficiente para imunizar toda a população até o fim deste ano.

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