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Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
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Imprensa SeebRio
O profundo corte de recursos imposto pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido) no Orçamento da União, que ameaça provocar o fechamento das universidades públicas brasileiras, guarda semelhanças com a política nazista colocada em prática na Alemanha na década de 1930, através da perseguição a qualquer forma de reflexão sobre a realidade e ao pensamento crítico, além da queima de livros e censura a peças e outras formas de arte. A avaliação é do escritor e professor aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Lincoln Penna, autor do livro “O capitão, o cabo e o capitalismo” que compila semelhanças entre Adolf Hitler e Jair Bolsonaro.
O governo federal cortou em mais de R$ 1 bilhão (18% a menos em comparação a 2020), o total previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) para as universidades públicas, o que inviabilizará o funcionamento destas instituições, com prejuízos não só ao ensino, mas à pesquisa, à extensão e à assistência estudantil. Hoje, 1,3 milhão de alunos estudam nas 69 universidades federais do país. Além da redução — que ocorre desde 2016—, a LOA trouxe um condicionamento de 60% do orçamento aprovado, que fará com que as instituições tenham um apagão em breve.
Segundo Lincoln Penna – que é também doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), Conferencista Honorário do Real Gabinete Português de Leitura e Presidente do Movimento em Defesa da Economia Nacional (Modecon) – a política de Bolsonaro é a de esvaziar a produção de ideias e as manifestações culturais, todas consideradas por ele e seus seguidores como de ‘orientação comunista’. Na verdade, denuncia, o corte propagandeado como parte de um suposto ajuste fiscal, esconde o real objetivo do governo.
“Bolsonaro reproduz a avaliação dos setores derrotados da ditadura, que julgaram que ao derrotar pelas armas os segmentos mais combativos da oposição ao regime resta eliminar os núcleos de pensamento crítico que se encontram nas universidades, teatro e demais expressões culturais. É diferente de Hitler, mas as consequências se assemelham na prática”, analisa.
Para a coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores da UFRJ (Sintufrj), Neuza Luzia, a guerra ao livre conhecimento é uma marca das expressões totalitárias e dos movimentos e governos de caráter fascista. “Mas é preciso lembrar que o ataque às universidades públicas, embora mais radical no governo Bolsonaro, não é inédito. Todos os governos neoliberais diminuíram o orçamento da educação e da saúde, abrindo espaço para exploração predatória de serviços essenciais pela iniciativa privada”, lembrou.
Acrescentou existir uma imensa “fatia de mercado” a ser aproveitada por corporações empresariais, e não só a existência, como a excelência das universidades públicas e do Sistema Único de Saúde (SUS), são uma barreira. “Lutamos há tempos para impedir que direitos fundamentais sejam considerados meros serviços, e essa luta continua”, afirmou.
Resistir ao retrocesso
Para Lincoln o corte terá consequências dramáticas para todo o país, agora e para as gerações futuras. “O impacto sobre alunos, professores e demais setores sociais atingidos são incalculáveis. Sem falar especificamente na interrupção de pesquisas em andamento. Mas terá implicações para todo o país, ao provocar um terrível retrocesso, de modo a comprometer, sem dúvida, as próximas gerações”, previu.
Neuza avisa, no entanto, que haverá resistência. Fez questão de ressaltar: “Por mais que o governo tente matar as universidades por inanição, promovendo uma radical asfixia financeira para impedir o seu funcionamento, é preciso reforçar que, do lado de cá, existe uma imensa comunidade, formada por estudantes, servidores docentes e técnico-administrativos em educação, que já deu inúmeras provas de capacidade de resistência”.
Lembrou que o que está em jogo é o futuro de uma parcela expressiva da juventude brasileira, que não vai abrir mão, vai disputar; e o trabalho de centenas de milhares de servidores públicos, nas mais diversas áreas, que é fundamental para o desenvolvimento do Brasil enquanto nação.
Bolsonaro quer destruir o país
Neuza acrescentou que as consequências seriam trágicas: “Só a UFRJ possui nove hospitais-escola e unidades de saúde, 13 museus, 45 bibliotecas, quase 1.500 laboratórios. São cerca de 54 mil estudantes! A nossa produção impacta o país em várias áreas, dos serviços de saúde prestados à população à pesquisa de ponta em todos os campos de conhecimento”.
A dirigente ressaltou que o que acontece no Brasil é um projeto articulado de destruição do país. “Não é incompetência, confusão ou falta de dinheiro; é um projeto de morte, de submissão ao capital financeiro, de destruição da soberania nacional e da democracia. Em suma, Bolsonaro comanda o enterro da Constituição de 1988”, afirmou.
Impeachment
Neuza fez um alerta: caso este governo não seja interrompido, deixará apenas escombros. “É um processo articulado de destruição do meio ambiente, dos serviços públicos, dos direitos trabalhistas, das empresas públicas e do patrimônio nacional; aumento brutal da concentração de renda, do desemprego, da miséria e da fome; aparelhamento das instituições (Forças Armadas, Judiciário, Polícia Federal)”.
Para a dirigente, uma das coisas mais simbólicas deste governo é que ele facilitou a compra de armas e aumentou a tarifação de livros. “E, além de tudo, tem a pandemia: estamos chegando à marca de meio milhão de mortos, ainda não temos vacinas suficientes, não temos condições de prever as sequelas que o país terá. O impeachment de Bolsonaro é um imperativo moral: ou este governo tem a sua vida abreviada, ou morreremos de doença, de fome ou de bala”, argumentou.
Corte é ainda maior
Segundo Edward Madureira, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG), com a drástica redução, o orçamento deste ano cai para R$ 4,5 bilhões, um corte de 18% em relação ao de 2020. “Em 2014 esse orçamento nominal foi de R$ 7,4 bilhões. Se atualizamos para valores atuais, esse orçamento seria o equivalente a R$ 10,7 bilhões. Hoje temos menos da metade disso, num universo com 100 mil alunos a mais", denunciou.
Mas o ataque às universidades públicas é ainda maior. Não bastasse o corte, desde 2020 o governo adota a aprovação da LOA em duas partes.
"Uma parte é o orçamento não condicionado, que representa 40% do total e que estamos recebendo; os outros 60% são condicionados a um PLN [Projeto de lei do Congresso Nacional], que tem de ser aprovado. Fora isso, ainda houve um contingenciamento de 13,8% do total da verba. Ou seja, são três mecanismos que impactam nosso orçamento", comenta.
Covid
Caso o resto do orçamento não seja liberado em breve, muitas pesquisas serão afetadas. Um exemplo do impacto desses cortes nos últimos anos, afirma Edward, ocorre no desenvolvimento de vacinas para covid-19. Pelo menos três instituições federais desenvolvem pesquisas que podem trazer um imunizante para os brasileiros.
As universidades federais de Minas, do Rio e do Paraná estão entrando agora em fase clínica de testes. “Se tivesse um financiamento justo, com valor significativo, com certeza elas já estariam adiantadas e não estaríamos dependentes de outros países. Nós temos expertise, o problema é que os orçamentos de ciência e tecnologia também são extremamente decrescentes ao longo dos anos”, comenta.