Quinta, 13 Agosto 2020 15:43

PDT pede afastamento de Guedes para que não obstrua investigações contra ele

Deputado Paulo Ramos: Guedes não pode continuar no cargo, é o principal investigado e comanda pessoas em poderosos cargos públicos que serão ouvidas nos inquéritos Deputado Paulo Ramos: Guedes não pode continuar no cargo, é o principal investigado e comanda pessoas em poderosos cargos públicos que serão ouvidas nos inquéritos

Olyntho Contente

SeebRio

O PDT entrou com pedido no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (12/8) requerendo o afastamento de Paulo Guedes do cargo de ministro da Economia. O objetivo é impedir que use o seu poder para barrar o avanço de três inquéritos da Força Tarefa Geenfield, da Procuradoria da República do Distrito Federal, que investigam a participação de Guedes em esquemas fraudulentos que causaram prejuízos bilionários a investimentos feitos por fundos de pensão. Dois deles têm Guedes e suas empresas e fundos de investimentos como alvos principais.

O pedido de afastamento foi feito através de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). O partido frisa que a permanência de Guedes pode "estorvar o bom andamento das investigações policiais" feitas pelos procuradores da República e pela Polícia Federal da Força Tarefa Greenfield. Na ação, o PDT pede que o ministro seja afastado ‘até a conclusão de todos os procedimentos investigativos nos órgãos de persecução penal, principalmente pela Força Tarefa Greenfield’.

Guedes obstrui investigações

Para o deputado Paulo Ramos (PDT-RJ), Paulo Guedes não pode continuar no cargo. “Ele é o principal investigado e tem sob o seu comando pessoas em poderosos cargos públicos que serão ouvidas também no inquérito, além dos presidentes e diretores dos fundos de pensão nomeados pelos presidentes das empresas estatais a ele subordinados”, frisou. Disse que o STF deve decidir se há conflito de interesses e, baseado nisso, dar a sua sentença. Acrescentou que Bolsonaro não pode dizer, com todo o aparato de informações do qual dispõe, que desconhecia os crimes que estão sendo investigados.

O que diz a ação

A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, com pedido de liminar para posterior análise pelo colegiado do STF, sustenta que Guedes sequer poderia ter sido nomeado ministro por Jair Bolsonaro (sem partido), já que era do conhecimento do presidente que Paulo Guedes se encontrava sob investigação do Ministério Público Federal, tendo a ação o objetivo de evitar ou reparar a lesão provocada pela nomeação, através do afastamento. Desta forma, impediria o ministro e pessoas nomeadas para os diversos órgãos públicos de usar o seu poder para frear o andamento dos inquéritos, garantindo a eles celeridade para, em caso de comprovação dos crimes investigados, possibilitar a saída definitiva de Guedes do ministério.

“No caso posto sob análise, o ato estatal do qual resulta a lesão que se pretende reparar consubstancia-se na indicação, pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, do Senhor Paulo Roberto Nunes Guedes para exercer o cargo de Ministro do Estado da Economia, mesmo sabendo que sobre ele já pesavam investigações acerca das fraudes nos fundos de pensão, o que denota nítido desvio de finalidade e inconteste acinte aos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade administrativa. Sendo esse o contexto, denota-se a satisfação do requisito do ato do Poder Público, estampado no artigo 1º, da Lei nº 9.882/99”, frisa a ação.

A ADPF cita os órgãos subordinados a Guedes com ex-sócios ou amigos dele nomeados para o seu comando e alvos de investigação, ‘que estão sob a influência e interferência do ora Acionado, a saber: Banco Central; Presidente da Caixa Econômica Federal; Presidente do Banco do Brasil; Presidente do BNDES; Empresas Estatais; Receita Federal; Conselhos diversos; Agências Reguladoras; e Fundos de Pensão (PREVI; PETROS; FUNCEF; FUNDAÇÃO CESP; VALIA; FUNDAÇÃO ITAÚ; UNIBANCO, BANESPREVE, etc)’.

A partir daí conclui: “Ou seja, há uma blindagem institucional quanto à matéria objeto de investigação pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. Isso porque o Senhor Paulo Roberto Nunes Guedes exerce o mais alto cargo do Ministério da Economia e tem pessoas ligadas (parentes e ex-sócios) a ele nos mosaicos societários envolvidos em procedimentos investigatórios de caráter criminal. Essas são, por exemplo, pessoas ligadas ao Senhor Paulo Guedes, que ocupam funções em órgãos subordinados ao Ministério da Economia ou integram outros órgãos que são alvos de controle Público ou já foram alvo de investigação”. Em seguida cita nomes de autoridades e membros de empresas, bancos privados e públicos ligados a Guedes, além de fundos de pensão que ocupam três páginas.

Ao defender a tutela antecipada a inicial da ação diz: “Desse modo, as situações de urgência precisam ser rapidamente debeladas, sob pena, de o risco que surge iminente deixar de ser abstrato e passar a ser concreto, tornando inútil e sem razão de ser uma proteção tardia”. Frisa que “o Senhor Paulo Guedes poderá interferir na escorreita elucidação dos fatos, o que denota a incompatibilidade do exercício do cargo nesse período. O perigo de lesão grave é inconteste, porquanto a ingerência indevida no deslinde das investigações pode acarretar inegáveis prejuízos tanto às investigações, quanto aos preceitos fundamentais violados”.

Os inquéritos

Dos três inquéritos que investigam fraudes e outros crimes que causaram prejuízos que chegam a R$ 5,5 bilhões a fundos de pensão, dois são voltados especificamente para investigar ilegalidades praticadas por bancos e empresas de investimentos num esquema comandado pelo então empresário Paulo Roberto Nunes Guedes, entre 2009 e 2018. Estes dois foram instaurados pelos Procuradores da República de Brasília da Força Tarefa Greenfield, Sara Moreira de Souza Leite e Anselmo Henrique Cordeiro Lopes.

Ambos apuram a participação de empresas de propriedade de Paulo Roberto Nunes Guedes, sobretudo a BR Educacional Gestora de Recursos S/A por crimes de gestão fraudulenta ou temerária e emissão e negociação de títulos mobiliários sem lastro ou garantias através de aplicações feitas pelo Fundo de Investimentos (FIP) BR Educacional e Fundo Brasil de Governança Corporativa. As transações causaram prejuízos bilionários aos fundos de pensão de empregados de estatais.

Os inquéritos passaram a correr em sigilo desde que em 1º de janeiro de 2019 Guedes se tornou ministro. O primeiro deles – instaurado em 2016 – investiga operações feitas entre 2009 e 2013 comandadas por Paulo Guedes, em investimentos em empresas do setor de educação privada, com recursos dos fundos de pensão. No curso destes levantamentos, os procuradores tiveram que abrir um novo inquérito, este já em 2018, ao encontrar novos e fortes indícios de gestão fraudulenta ou temerária de recursos de fundos de pensão, através do Fundo de Investimentos Brasil de Governança Corporativa Multiestratégia (FIP BGC), que tinha como cotista a BR Educacional de Guedes e o FIP Caixa Modal Óleo e Gás Investimentos em Participações (do Banco Modal).

Prejuízos milionários

O primeiro inquérito mostra que a BR Educacional cobrou taxas de administração e de performance do investimento consideradas pelos procuradores como abusivas, com o artifício de serem calculadas sobre o capital subscrito e não sobre o capital investido, como deveria ser. O prejuízo decorrente foi de mais de R$ 152 milhões, a valores de 2018. Os procuradores suspeitam que Guedes abocanhou ainda mais recursos, pois aparecia, ao mesmo tempo, como presidente da BR Educacional, como conselheiro da Ânima Holding S/A e da BR Educação Executiva S/A (recebedoras dos investimentos). Aponta, ainda, conflito de interesses, já que Guedes obteve os recursos dos fundos de pensão, era proprietário das empresas gestoras dos fundos responsáveis por investir o dinheiro e presidente e conselheiro de administração das empresas que receberam os investimentos.

Outro indício de ilegalidade foi o ágio na compra de ações da empresa Gaec Educação, pelo FIP BR Educacional, ou por permuta por ações da BR Educacional: em março de 2013 uma ação valia R$ 51, em abril foi comprada pelo FIP por R$ 217 e via permuta por R$ 570. Os procuradores descobriram que a contratação da BR Educacional foi feita às cegas pelos fundos de pensão, já que não havia menção das empresas-alvo dos investimentos, indício de uma relação espúria entre as partes contratantes. Reforça esta tese a assinatura de contrato provisório entre a Bradesco Asset Management e os fundos de pensão, até que a BR Educacional recebesse autorização para funcionar da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Trambiques

A partir da constatação de mais indícios da participação de Paulo Guedes em gestão fraudulenta ou temerária com dinheiro de sete fundos de pensão, os procuradores da Força Tarefa Greenfield foram obrigados a instaurar um novo inquérito. Guedes procurava não aparecer na transação. Os investimentos, de mais de R$ 1 bilhão, foram feitos através do Fundo de Investimentos e Participações Brasil de Governança Corporativa Multiestratégia (FIP BGC) e do FIP Caixa Modal Óleo e Gás Investimentos em Participações. Guedes era não apenas a ligação entre as operações investigadas nos dois inquéritos, como comandou ambas, através da BR Educacional Gestora de Recursos S/A (da BR Investimentos, depois Bozano Investimentos). No segundo caso, a gestora era cotista do FIP BGC.

O FIP BGC captou dos fundos de pensão (entre outros a Previ, do Banco do Brasil, Funcef, da Caixa Econômica Federal, Fapes, do BNDES) R$ 600 milhões para investir nas empresas Enesa Participações S/A, Abril Educação, Hortigil Hortifruti, Newpark Participações e Alpark S/A. Já o FIP Óleo e Gás investiu R$ 500 milhões dos mesmos fundos de pensão também na Enesa Participações, e na Embraequip e na Georadar. Os mais de R$ 200 milhões aplicados na Enesa, pelos dois FIPs, no entanto, viraram pó. Segundo os procuradores, a empresa tinha patrimônio negativo. Em valores de outubro de 2018, essa perda total do investimento chegou a um montante superior a R$ 719 milhões. Segundo a Forã Tarefa Greenfield, não houve análise de risco do investimento.

Outra fraude verificada foi a de que em datas próximas à entrada, via FIPs (Brasil Governança Corporativa e Modal Óleo e Gás), dos recursos dos fundos de pensão na Enesa Participações S/A (5 de maio de 2010) houve distribuição de dividendos de R$ 77 milhões, caracterizando saída de recursos.

Empresas fantasmas

Outra grave fraude era a existência entre as sete empresas em que a Enesa Participações aparecia como sócia, de apenas duas em efetivo funcionamento: a Enesa Engenharia Ltda e a Brasil Lau-Rent Locação de Equipamentos Ltda. As demais, os procuradores suspeitaram serem de fachada, devido ao baixo capital social apresentado: respectivamente R$ 100, R$ 500, R$ 1 mil, R$ 10 mil e R$ 50 mil. Levantamento da PricewaterhouseCoopers mostrou que não tinham atividade operacional a Enesa Óleo e Gás, a Enesa Comércio e Serviços e a Enesa Investimentos e Infra-Estrutura S/A, existindo só no papel.

Apesar disto, esta última registrou em 13 de agosto de 2018, aumento de capital: de R$ 100 para mais de R$ 327 milhões. O que levou à suspeita de ser um desvio do dinheiro dos fundos de pensão que teria sido perdido na Enesa anteriormente. E mais: os procuradores descobriram que em 24 de agosto daquele ano, a Enesa Investimentos S/A foi transformada em Ltda, quando o que geralmente acontece é o caminho oposto.

Mais à frente encontraram novos indícios de fraudes e desvios do dinheiro. Descobriram que, antes do aumento de capital, os gestores do FIP Brasil Governança Corporativa e FIP Modal Óleo e Gás venderam 100% das cotas dos respectivos fundos a Sérgio Ferreira Laurentys, dono da Holding Enesa em 1º de agosto de 2018, respectivamente por R$ 100 mil e R$ 77 mil. Na negociata, o FIP Brasil Governança Corporativa foi representado pela Bozano Venture Partners Ltda (incorporação da BR Educacional Gestora de Recursos S/A pela Bozano Investimentos, de Paulo Guedes) e o FIP da Modal Óleo e Gás (do Banco Modal) pela Brasil Plural Gestão de Produtos Estruturados (do Banco Plural).

Outra comprovação de que teria havido conluio e fraude com os recursos foi que a avaliação da PreciwaterhouseCoopers que mostrou ser negativo o patrimônio da Enesa Participações S/A só foi feito em 27 de março de 2018, portanto, um mês após a venda das cotas à Holding Enesa. A venda, aliás, só foi aprovada pelos cotistas dos FIPs, ou seja, os fundos de pensão das estatais, em 11 de maio de 2018, ou seja, três meses após a venda.

Os procuradores descobriram, ainda, que a Enesa Invesimentos em Infra-Estrutura não constava como integrante da Holding Enesa, nos registros da Junta Comercial de São Paulo. Nestes registros não consta, ainda, a realização de assembleia de acionistas para o aumento de capital. E mais: quando foi alterada a natureza jurídica de S/A para Ltda foram registrados como ‘sócios’ da Enesa Investimentos em Infra-Estrutura a Enesa Participações S/A, com capital de mais de R$ 327 milhões e a SHLM com cerca de R$ 32 mil. Ambas têm o mesmo endereço e como diretor-presidente Sérgio Ferreira de Laurentys.

Cheque em branco

Na visão dos procuradores, a ausência de análise de risco do investimento e da citação das empresas-alvo da aplicação dos recursos foi vista como um cheque em branco em favor da gestora, o Banco Internacional do Funchal (Banif Brasil) ao início da decisão de investimento, que passou depois para a BR Educacional Gestora de Recursos S/A de Guedes. Os procuradores determinaram que fossem tomados depoimentos dos representantes dos fundos de pensão, do Banif, da BR Educacional, da Modal Administradora de Recursos Ltda e da Brasil Plural Gestão de Recursos Ltda.

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