Quinta, 30 Julho 2020 16:50

Operação Greenfield deve denunciar Paulo Guedes por fraude contra fundos de pensão

Deputado Paulo Ramos acusa Guedes de comandar negócios dentro e fora do governo e de transformar Ministério da Economia em sucursal do BTG-Pactual. Deputado Paulo Ramos acusa Guedes de comandar negócios dentro e fora do governo e de transformar Ministério da Economia em sucursal do BTG-Pactual.

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SeebRio

O ministro da Economia e cofundador do banco de investimentos BTG-Pactual deve ser denunciado à Justiça pela força tarefa da Operação Greenfield, da Procuradoria da República do Distrito Federal e da Polícia Federal, por fraudes contra fundos de pensão de empregados de empresas estatais. A informação foi dada pelo deputado Paulo Ramos (PDT-RJ) nesta entrevista. Guedes é um dos principais investigados num inquérito instaurado pela procuradoria – e que corre em sigilo desde a sua posse como ministro – por gestão fraudulenta de R$ 1 bilhão junto a sete fundos de pensão. A suspeita é que enquanto lucrava através de aplicações feitas por meio de fundos de investimentos por ele criados, como a BR Educacional Gestora de Recursos S/A e Brasil Governança Corporativa, os fundos de pensão ou tiveram prejuízos ou ganhos ínfimos. Visando impedir que Guedes use seu poder para atrapalhar as investigações, o PDT deverá entrar no STF com pedido para o seu afastamento do cargo de ministro. Ramos criticou o sigilo imposto ao andamento do inquérito e o silêncio da mídia sobre o caso. Acusou Guedes de comandar um esquema privado de negócios dentro e fora do governo e de ter transformado o Ministério da Economia numa espécie de sucursal do BTG-Pactual. Frisou que o banco de investimentos fundado por Guedes tem quase 40 filiais em paraísos fiscais, lembrando que este tipo de negócio serve essencialmente para especulação, evasão fiscal, lavagem de dinheiro e acobertamento de corrupção, tanto de empresas quanto de pessoas físicas

SeebRio – A Operação Greenfield, que investiga a participação do ministro da Economia, Paulo Guedes, em fraudes contra fundos de pensão de empregados de estatais começa a avançar. Mas não lhe parece que avança muito lentamente?

Paulo Ramos – A Operação Greenfield investiga fraudes em fundos de pensão dos empregados de praticamente todas as estatais e bancos oficiais. O principal investigado, além dos gestores dos fundos, é o atual ministro da Economia, Paulo Guedes. A Operação Greenfield tem uma complexidade muito grande. Ela está sendo realizada há alguns anos (desde 2016). Mas, no final de 2018 (11 de outubro), o procurador da República, Anselmo Henrique (Cordeiro Lopes), abriu um outro inquérito. Ele estava concluindo um e constatou ilícitos a partir da participação do Paulo Guedes em outros fundos de pensão. A delegada da Polícia Federal responsável pelo caso é Danielle (de Meneses Oliveira) Mady. Agora no início do ano vários gestores de fundos de pensão foram denunciados pela Procuradoria da República do Distrito Federal. Mas só os gestores. O ministro Paulo Guedes, no final de 2018, quando já estava intimado a prestar depoimento, aproveitou que seria ministro, procrastinou a prestação do depoimento e trocou de foro. Passou a ser ministro, e o caso foi para o Supremo Tribunal Federal. Eu acredito no empenho da força-tarefa Greenfield e da Procuradoria e da Polícia Federal. Como houve a denúncia dos gestores, agora no início do ano, acredito que falte pouco para a denúncia contra o Paulo Guedes e aqueles que com ele compartilharam os atos praticados.

SeebRio – Devido à gravidade da situação, o ministro não deveria ter sido afastado?

Paulo Ramos – Sim. O PDT, inclusive, como fez no caso do novo diretor-geral da PF nomeado por Bolsonaro, deve entrar com ação no STF, ainda esta semana, para que Paulo Guedes seja impedido de continuar à frente do Ministério da Economia, pelo menos até a conclusão das investigações, porque, permanecendo no cargo ele pode atrapalhar o inquérito. Afinal de contas, ele é, na Operação Greenfield, o principal investigado privado, porque os outros, os gestores, já foram denunciados. Mas é preciso que se diga que o Paulo Guedes não poderia sequer ser ministro. Está eticamente impedido. Eu fiz um levantamento e são muitos os fundos de investimentos, são muitas as empresas das quais ele participa. Ele, por exemplo, é um dos cofundadores do BTG-Pactual. O presidente do BNDES (Gustavo Montezano) foi do BTG-Pactual e é filho do amigo do Paulo Guedes (Roberto Montezano) na criação do IBMEC (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais), do qual Guedes foi fundador. O presidente do Banco do Brasil (Rubem Novaes) é amigo de longa data de Guedes. Estudaram juntos na University of Chicago. O presidente da Caixa Econômica Federal foi do BTG-Pactual. E O BTG-Pactual tem tido relações financeiras íntimas com instituições financeiras públicas. Agora mesmo, acaba de ganhar um contrato com o Banco do Brasil que passa de R$ 300 milhões (o BTG-Pactual comprou por R$ 371 milhões a carteira de crédito do BB de R$ 2,9 bilhões, numa operação suspeita de favorecimento). Então o braço do BTG-Pactual está no governo. O Paulo Guedes se afastou taticamente. Mas está eticamente impedido de ocupar o cargo de ministro da Economia.

SeebRio – As autoridades e a mídia, parecem ter ignorado a necessidade de aprofundar, agilizar e dar divulgação às investigações durante as eleições, quando já se sabia que, no caso da vitória de Bolsonaro, Guedes seria seu ministro da Economia. Qual a sua avaliação a este respeito?

Paulo Ramos – Eu vejo que a mídia dá pequenas notas, pequeníssimas notas. Mas por que, se este caso é um escândalo tão grande? Lamento muito ter que dizer que não sei por que os grandes meios de comunicação não se interessam em demonstrar quem é o ministro Paulo Guedes, a quem ele está ligado, que ele é suspeito e está sendo investigado e por que motivos. Tem que divulgar.

SeebRio – O senhor acha que se justifica colocar sob sigilo as investigações sobre Paulo Guedes?

Paulo Ramos – Qual a razão deste sigilo para proteger o ministro Paulo Guedes? Eu vejo que ele está blindado. Prova disto é que no despacho da Operação Greeenfield, de 25 de outubro de 2018, o procurador da República Anselmo Henrique fala da preocupação com os prazos prescricionais (tempo após o qual um inquérito ou processo prescreve, sendo arquivado). Mas diz também que tudo deveria ser transparente e divulgado. Logo depois empossado como ministro tudo foi considerado sigiloso. Eu não estou prejulgando o ministro Paulo Guedes, nem o irmão dele, nem a irmã dele. Mas o sigilo não se justifica.

SeebRio – Há envolvimento familiar nos negócios do ministro da Economia?

Paulo Ramos – As universidades brasileiras se valorizaram muito com o Pró-Uni e com o Fies, a ponto de fundos de investimentos estrangeiros terem comprado universidades brasileiras. E ele (Paulo Guedes) pegava recursos no BNDES para investir nas universidades particulares. A irmã dele é presidente ou vice-presidente de uma entidade que representa mais de 200 universidades particulares. Eu cito este fato para exemplificar que é muito vasto o campo de atuação do ministro Paulo Guedes em relação a recursos públicos. Eu não estou prejulgando, mas o meu entendimento é de que ele não poderia ser ministro da Economia. Ele está eticamente impedido. O mínimo de seriedade já o excluiria. Ele não deveria nem ter sido convidado. Mas ele, pelo contrário, procurou, perseguiu, lutou para ser ministro da Economia. Primeiro se aproximou do Luciano Huck, depois do PSDB do Geraldo Alckmin e quando viu que um não foi candidato e o outro caminhou mal nas eleições, se aproximou do grupo do Jair Bolsonaro. Aliás, na minha avaliação, e tenho informações que me autorizam a dizer, ele também se aproximou do então juiz Sérgio Moro. Há comprovações de que ele recebeu tratamento diferenciado na Lava Jato. Na minha avaliação, ele intermediou e convidou o juiz Sérgio Moro para ser ministro da Justiça.

SeebRio – Como o senhor avalia o comportamento de Guedes de correr com as privatizações?

Paulo Ramos – Nós estamos aí vendo a tragédia da pandemia e o ministro Paulo Guedes acelerando providências no sentido de, por exemplo, pôr em prática o desmonte da Petrobras. Disse ainda que está planejando quatro grandes privatizações nos próximos noventa dias. Falou naquela reunião fatídica (de Bolsonaro com os ministros em 22 de abril) com o apoio do presidente do Banco do Brasil, do interesse de privatizar o BB, privatizar os Correios, a Casa da Moeda, a Eletrobrás. Está tudo aí na bacia das almas. A pandemia ocupando os espaços na mídia e o Guedes aproveitando-se desta tragédia. É como disse aquele ministro do Meio Ambiente: a boiada vai passando. Ele está se aproveitando de tudo isso para cumprir a tarefa a que se dispôs com seus sócios que é entregar o patrimônio público à iniciativa privada por três dinheiros, ou de graça, porque isso é uma espécie de antro. Há um conluio muito grande.

SeebRio – O senhor fez em fevereiro denúncia ao STF e ao MPF contra o ministro, sustentando que ele continua a fazer negócios no mercado financeiro, mesmo estando no cargo. Que providências foram tomadas desde então?

Paulo Ramos – – Eu encaminhei ofícios, relatórios, ao Supremo Tribunal Federal, ao Ministério Público Federal, ao Tribunal de Contas da União, à Controladoria Central da União e à Comissão de Ética Pública da Presidência da República. O STF recebeu meu documento e encaminhou ao Ministério Público Federal. Mas não determinou o que fazer em relação ao ministro Paulo Guedes.

SeebRio – O senhor acredita que o presidente Bolsonaro sabia dos negócios que estariam sendo feitos por Guedes, antes e após a posse no ministério da Economia?

Paulo Ramos – O presidente Bolsonaro, não é possível que ele não saiba. Até porque ele tem no entorno dele o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), ele tem os órgãos de informação, e a figura do Paulo Guedes é uma figura conhecida. A grande questão é que o ministro Paulo Guedes é quem define a política econômica do governo Bolsonaro, de desmonte do Estado brasileiro. Não é à toa que ele está aproveitando esses últimos meses em que ele deverá permanecer à frente do Ministério para acelerar o programa de privatizações.

SeebRio – Os negócios de Guedes envolveriam também outras autoridades e grupos estrangeiros?

Paulo Ramos – Bem, já citei os presidentes dos bancos públicos, amigos há longos anos dele, que foram do BTG-Pactual, como o presidente do BNDES. O Salim Matar, dono da Localiza, exerce o cargo no Ministério da Economia, que conduz as privatizações. O ministro Paulo Guedes foi diretor da Localiza. Foi empregado do Salim Matar. Há um grupo com estreitas vinculações dentro do Ministério. A Daniele Consentino, que integrou com o Paulo Guedes vários fundos de investimentos, várias empresas, é uma das investigadas pela força-tarefa Greenfield, exerce cargo no Ministério da Economia. É vinculada a ele.

SeebRio – Gostaria de saber se há vinculações de Paulo Guedes e o seu grupo no governo e fora dele com grupos estrangeiros?

Paulo Ramos – O BTG-Pactual tem agências em quase todos os paraísos fiscais (quase 40 filiais, entre outros nas Ilhas Cayman, Luxemburgo, Bermuda, Panamá, Delaware, Gibraltar e na Suiça). Então não é possível que as autoridades, entre estas os presidentes dos bancos (públicos), ou o ministro não tenham ligações com grupos estrangeiros. Até porque ele tem uma carreira muito grande e envolvimentos. E relações com grupos estrangeiros. É lavagem de dinheiro? Intimamente, não tenho nenhuma dúvida quanto a isto. É bom lembrar que este tipo de negócio (em paraísos fiscais) serve essencialmente para especulação, evasão fiscal, lavagem de dinheiro e acobertamento de corrupção, tanto de empresas como de pessoas físicas. É o que tem que ser investigado.

SeebRio– Como funciona o esquema de Paulo Guedes, na prática?

Paulo Ramos – Ele tem e se relaciona com várias empresas, inclusive a XP Investimentos S/A, que é a grande protagonista de investimentos e participações. Guedes inseriu na máquina administrativa, no Ministério da Economia e nos órgãos subordinados, pessoas da confiança dele, ligadas a ele, para aprofundar o desmonte do Estado, dificultar as investigações e continuar pegando recursos públicos para investimentos naquilo que ele próprio seleciona.

 

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