Terça, 14 Abril 2020 19:49
NEM COM A PANDEMIA

O mundo pratica taxas zero ou negativa e bancos querem aumentar juros no Brasil

Mesmo praticando o crédito mais caro do mundo e recebendo ajuda do governo de R$1,2 trilhão, bancos dizem que é preciso elevar mais os juros

Carlos Vasconcellos

Imprensa SeebRio

O setor financeiro nacional, que há pelo menos 40 anos acumula os maiores lucros no país não abre mão de seus ganhos bilionários ano após a ano, nem mesmo diante de uma crise econômica que pode ser a pior da história do capitalismo em função da pandemia do coronavírus. Durante transmissão em videoconferência da Necton Investimentos na última segunda-feira (13), o economista chefe da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), Rubens Sardenberg, disse que em função do que chamou de “hibernação da economia” e para que “as pessoas e empresas consigam ter recursos para passar pelo momento de quarentena”, os bancos “necessitam de uma liquidez maior” e a que a conjuntura exige “juros mais ainda mais altos”.

“Estender o crédito nas condições atuais me parece um grande passo, já que as condições de risco são muito mais adversas agora do que eram antes, com elevação do custo de captação, menor liquidez e um risco de crédito muito maior. Tudo exige taxas (de juros) ainda maiores”, disse.

O vice-presidente da Contraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro) Vinícius de Assumpção repudiou a afirmação do representante dos bancos.

“É inacreditável a capacidade do governo brasileiro e dos banqueiros de irem na contramão do mundo, mesmo diante de uma depressão que se avizinha devido à pandemia. Enquanto na Europa, nos EUA e no Japão os sistemas financeiros baixam os já reduzidos juros, chegando a zero e até a juros negativos em alguns casos para impulsionar o crédito e fazer girar a economia, no Brasil os bancos querem se aproveitar para elevar ainda mais a taxa de juros, que já são as maiores do planeta”, disse o sindicalista. 

Ajuda generosa do BC

O presidente da Febraban Isaac Sidney tentou justificar a declaração do economista da entidade patronal afirmando que “parte da composição do risco é resultado da maior demanda das grandes empresas no início da crise, cujos desembolsos subiram de 5 a 10 vezes em função das perdas na Bolsa de Valores”.

“Os bancos continuam monitorando o risco de crédito e de inadimplência. Há um esforço para que pessoas físicas e pequenas e médias empresas tenham as taxas de juros mantidas nas negociações e nas novas concessões de empréstimos”, acrescentou, deixando claro que de fato há a intenção das instituições financeiras de elevar ainda mais os juros no Brasil.

Pessoas físicas e empresas relatam dificuldade de acesso ao crédito nos últimos dias, mesmo com o reforço que os bancos receberam do Governo Bolsonaro, através do Banco Central, a generosa ajuda de mais de R$1,2 trilhão, que representa em torno de 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. O volumoso dinheiro para o sistema financeiro não vem acompanhado de nenhuma contrapartida social, crédito mais barato para trabalhadores e micro e pequenas empresas ou de socorro para a população mais vulnerável. Segundo palavras do próprio presidente do BC, Roberto Campos Neto, ex-executivo do Banco Bozzano Simonsen, o objetivo do repasse é “dar mais liquidez aos bancos”.

A serviço da especulação

Vinícius de Assumpção criticou ainda o fato de os dirigentes da Febraban omitirem os gordos repasses e ajudas que o governo federal deu aos bancos, antes de qualquer medida para socorrer os mais pobres, pequenos empreendedores, trabalhadores informais e desempregados.

“O cartel do sistema financeiro está pensando exclusivamente nele mesmo porque querem continuar acumulando bilhões diante de uma economia que já estava em frangalhos antes do coronavírus. O ministro Paulo Guedes repassou R$1,2 trilhão ao setor mais lucrativo do país e tomou outra medida vergonhosa, ao permitir que o BC compre papeis podres para evitar possíveis prejuízos aos banqueiros e especuladores, isentando ainda os tecnocratas que vão autorizar essas operações de qualquer responsabilidade perante as leis e o país”, critica.  

A permissão para que o BC faça esses investimentos está sendo debatida pelo Congresso Nacional dentro da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do chamado "orçamento de guerra", que cria um “orçamento paralelo”, com recursos exclusivos e a justificativa de que a medida é para o enfrentamento da crise gerada pela pandemia do novo coronavírus. Mas, em outras palavras, o governo blinda os bancos dos riscos de perdas em operações especulativas e de títulos podres e os prejuízos vão ficar a cargo do dinheiro público.

“O Banco Central é transformado em agente independente do mercado especulativo e toda a conta será paga pelo Tesouro Nacional. Os bancos se livram dos papéis podres e recebem títulos da dívida pública brasileira, que pagam os maiores juros do mundo. Um verdadeiro prostíbulo financeiro”, conclui Vinícius.

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