Quinta, 19 Março 2020 20:55
A CRISE DO CORONAVÍRUS

Na contramão do mundo, governo Bolsonaro pune o trabalhador para proteger as empresas

Enquanto EUA e Europa suspendem pagamentos de tarifas de serviços essenciais e injetam dinheiro para proteger consumo das famílias, decreto criado pelo ministro Paulo Guedes e o Programa Verde Amarelo agravam ainda mais a recessão no Brasil aprofundada pela pandemia
NÃO É SÓ O CORONAVÍRUS - O ministro da Economia insiste na tese de retirar direitos e reduzir a renda média dos trabalhadores para diminuir custos das empresas com a mão de obra. A estratégia é suicida para a economia, ainda mais em depressão global NÃO É SÓ O CORONAVÍRUS - O ministro da Economia insiste na tese de retirar direitos e reduzir a renda média dos trabalhadores para diminuir custos das empresas com a mão de obra. A estratégia é suicida para a economia, ainda mais em depressão global José Roberto Afonso/O Globo

Por Carlos Vasconcellos

No mundo inteiro, os governos tomam medidas urgentes para tentar minimizar a possível depressão do capitalismo global, causado pela pandemia do novo coronavírus. O governo brasileiro toma decisões na contramão das ações necessárias para proteger a economia do país. Seguindo a lógica de Bolsonaro, que antes da pandemia declarou, ainda na campanha eleitoral, que o povo teria de escolher entre emprego e direitos, o ministro Paulo Guedes incluiu, em Medida Provisória, a permissão para que empresas possam reduzir até pela metade o salário de seus funcionários e também a jornada de trabalho.

E o mais grave: o acordo será realizado individualmente entre patrão e empregado, sem negociação com entidades sindicais e até acima das leis trabalhistas vigentes.

A economia não gira

A justificativa do governo é a de que a MP é necessária por causa da crise do novo coronavírus e que esta seria uma forma para “combater o desemprego”. Mas com redução de renda dos brasileiros, a roda do capitalismo não voltará a girar: o povo não consome, o comércio não vende e a indústria não produz, agravando a recessão e gerando ainda mais falências de empresas, o que contribui para o aumento o desemprego.

O trabalho precário eleva o número de empregados doentes e licenciados, reduzindo a tão exaltada “produtividade” pelos mercados e elevando os gastos do INSS, além de colapsar o Sistema Público de Saúde (SUS)

Consumo das famílias

Economistas, mesmo alguns liberais, são unânimes em afirmar que o consumo das famílias é o principal vetor para enfrentar as crises. As mudanças duras do governo brasileiro, que contrariam essa máxima, são tomadas no momento em que o trabalhador mais precisa de massa salarial para gastos com saúde e medicamentos, alimentação saudável e uma possível necessidade de estocar alimentos. A redução do poder de compra das famílias é uma decisão suicida para a economia do país diante de uma previsível depressão econômica global sem precedentes na história da humanidade.

Perda de direitos

O chamado Programa Verde e Amarelo (MP 905), na verdade mais um desmonte dos direitos trabalhistas. Pelo projeto, com a justificativa de estimular a criação de empregos para jovens, o governo reduzirá drasticamente verbas de periculosidade – que eleva a exposição dos trabalhadores ao ambiente insalubre – além da redução da multa do FGTS paga ao empregado demitido, que cairá de 10% para 2% e outras mudanças prejudiciais à qualidade de vida e de trabalho dos brasileiros. 

O programa (MP nº 905, de 2019), apresentado pelo governo como um pacote de estímulo ao emprego para jovens (18 a 29 anos) e que teve um destaque parlamentar que inclui ainda os idosos acima de 55 anos, representa “um novo desmonte dos direitos trabalhistas”. Na avaliação do Dieese (Departamento Intersindical de Estudos Sócio-econômicos), as medidas não terão eficiência para o combate ao desemprego e tornarão as condições de trabalho ainda mais precárias, além de reduzir os ganhos dos trabalhadores.

O mundo faz o oposto

Enquanto o governo Bolsonaro se aproveita da crise mundial para acelerar reformas e projetos que retiram direitos e reduzem o poder de compra dos trabalhadores, as nações desenvolvidas executam literalmente o oposto para proteger o consumo das famílias a fim de tentar salvar a economia de seus países ante a depressão econômica que se avizinha.

EUA e Europa vão bancar para o trabalhador ficar em casa. O presidente dos EUA Donald Trump vai pagar mil dólares por mês (R$5 mil) para cidadãos americanos com o objetivo de aliviar as consequências da crise do coronavírus em seu país. Empresas com até 500 funcionários terão apoio do governo para decretar férias remuneradas para seus funcionários e trabalhadores e os autônomos terão isenções fiscais.

O Reino Unido vai estender o pagamento aos cidadãos que necessitarem ficar em quarentena. O governo vai garantir os custos do afastamento do empregado. A França decretou quarenta de suspendeu o pagamento de impostos, como luz, água e gás e Portugal vai pagar parte dos salários de quem tem filhos menores de 12 anos e precisar ficar em casa para cuidar de suas crianças. Autônomos vão receber uma ajuda de 438,81 euros (cerca de R$2.407).

E os juros, Paulo Guedes?

No Brasil, o ministro Paulo Guedes anunciou míseros R$200 mensais para trabalhadores autônomos. Já os juros praticados pelos bancos no Brasil, que na Europa tombam e chegam a ser negativos e nos EUA quase zero, continuam superando a barreira de 300% a 400% ao ano. O país assiste estarrecido ao silêncio sórdido dos banqueiros e seu cartel do sistema financeiro e do governo federal quando o assunto é praticar o padrão dos juros internacionais para proteger o consumo em dias tão difíceis. Redução por aqui só mesmo da Selic, os juros básicos, que contribuem para a redução da dívida pública de União, estados e municípios, mas não repercutem diretamente na vida dos brasileiros.

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