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Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Publicado: 10 Novembro, 2025 - 17h01 | Última modificação: 10 Novembro, 2025 - 17h20
Escrito por: André Accarini

Sob aplausos da bancada conservadora, a Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira, dia 5, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 3/2025, que anula as diretrizes do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) sobre o direito ao aborto em crianças e adolescentes vítimas de estupro. A medida, apelidada por movimentos de defesa dos direitos humanos de “PDL da pedofilia” desmonta políticas de acolhimento e deixa vítimas de violência sexual ainda mais vulneráveis.
A norma do Conanda havia sido aprovada em 2024 e estabelecia protocolos de atendimento humanizado a meninas e adolescentes vítimas de violência sexual, assegurando o acesso ao aborto legal e a proteção diante de agressores muitas vezes dentro da própria casa. A resolução reafirmava o que o Código Penal e a Constituição já garantem – o direito ao aborto nos casos de estupro e o dever do Estado de proteger crianças e adolescentes.
Ainda assim, a maioria dos deputados decidiu rasgar esse princípio em nome de um moralismo que ignora a realidade brutal da violência sexual no Brasil. O texto agora segue para o Senado.
De autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e apoiado pela bancada conservadora, o PDL foi apresentado sob o argumento de que o Conanda teria “extrapolado suas atribuições” ao dispensar o boletim de ocorrência e a autorização dos responsáveis para a interrupção da gestação em casos de estupro intrafamiliar. No entanto, é justamente nesses contextos que o silêncio e o medo predominam e que a exigência de um registro policial ou da anuência da família se torna uma segunda violência.
Não fechar os olhos
“Precisamos de um olhar mais atento às nossas crianças e adolescentes. As estatísticas mostram que os estupros acontecem dentro das casas, cometidos por pais, padrastos, tios e avôs. Imagine uma criança carregar no ventre outra criança, fruto de um ato tão abominável. A aprovação desse PDL significa ampliar os riscos e desrespeitar princípios constitucionais de dignidade e igualdade”, afirma Amanda Corcino, secretária da Mulher Trabalhadora da CUT.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registrou em 2022 o maior número de estupros da história: 74.930 vítimas. Seis em cada dez eram crianças de até 13 anos. Sete em cada dez meninas violentadas tinham entre 10 e 13 anos, e em 70% dos casos o agressor era alguém da família ou do círculo de confiança. Mesmo assim, apenas cerca de 10% desses crimes chegam à polícia.
Esses dados escancaram o que o PDL tenta apagar. A violência sexual contra crianças é cotidiana, e o lar, muitas vezes, é o lugar onde ela acontece. A resolução do Conanda reconhecia isso ao prever que, diante da suspeita de abuso intrafamiliar, o atendimento médico poderia ocorrer sem a autorização dos responsáveis, que podem ser justamente os agressores. Agora, com a suspensão da norma, o Estado se retira e devolve a menina à tutela de quem a violentou.
Para Amanda Corcino, o PDL não apenas dificulta o acesso ao aborto legal como também enfraquece a rede de proteção às vítimas de estupro de vulnerável.
“Esse decreto não trata de ‘ampliar o aborto’, como dizem os conservadores. Ele trata de humanizar o atendimento. De garantir acolhimento onde o Estado falhou, de proteger a menina que foi violentada e agora precisa de amparo, não de julgamento”, explica. “O que eles chamam de defesa da vida é, na verdade, uma condenação da infância à dor e ao abandono.”
Comemoração abominável
Enquanto deputados da extrema direita comemoraram a aprovação com gritos de “vitória da vida”, parlamentares progressistas reagiram sob o lema “criança não é mãe”, denunciando o retrocesso e alertando para o impacto direto na saúde e na vida de meninas pobres e negras — as mais atingidas.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, nos últimos dez anos o Brasil registrou, em média, 20 mil partos de meninas com menos de 14 anos por ano, sendo 74% delas negras. A cada dois dias, uma menina dessa faixa etária morre em decorrência de gravidez. É a segunda principal causa de morte entre crianças e adolescentes do sexo feminino.
O abuso infantil acontece muito no ambiente em que a criança vive, e é praticado por pessoas conhecidas. A família muitas vezes abafa a situação, trata como se fosse impossível. Outras vezes depende financeiramente do agressor. É por isso que a resolução era tão importante. Ela garantia que essas meninas pudessem ser ouvidas e protegidas
Disputa ideológica
O PDL 3/2025 aprofunda um ciclo de hipocrisia e violência institucional. Ao invalidar o protocolo do Conanda, o Estado se afasta das vítimas e se alinha a um discurso que transforma a dor das meninas em palanque ideológico. A deputada autora do projeto chegou a afirmar que o combate à violência sexual deve ocorrer “pelo fortalecimento da segurança pública”, sem “incentivar o aborto”. Mas os números mostram que não há segurança possível quando a ameaça mora dentro de casa e quando o Estado se recusa a ouvir a criança.
Além de desmontar uma política técnica e de proteção, o PDL aprofunda desigualdades sociais. Meninas pobres, sem acesso a clínicas privadas, serão forçadas a gestações de risco ou a procedimentos clandestinos, enquanto as mais ricas continuarão a recorrer a serviços seguros. O resultado é o aumento de mortes evitáveis, traumas permanentes e a perpetuação da desigualdade.
“O corpo da mulher, e especialmente o corpo da menina, continua sendo campo de disputa política. A diferença é que agora a disputa acontece sobre uma infância violada e desamparada”, critica a dirigente da CUT.
Além disso, ao celebrar a retirada de um direito como “vitória da vida”, a Câmara transforma vítimas em culpadas e legitima o silêncio que protege abusadores. “O nome disso não é defesa da vida. É conivência com a violência”, diz Amanda.
No Congresso
Após aprovação da Câmara dos deputados, o projeto segue para análise no Senado. Movimentos de mulheres, entidades de direitos humanos e especialistas em saúde pública já articulam uma reação para barrar o avanço do PDL e restabelecer as garantias previstas na resolução do Conanda.
Quem são os parlamentares que votaram a favor do PDL:
Avante
André Janones (MG)
Bruno Farias (MG)
Delegada Ione (MG)
Greyce Elias (MG)
Neto Carletto (BA) – Não
Pastor Sargento Isidório (BA)
Cidadania
Any Ortiz (RS)
MDB
Acácio Favacho (AP)
Alceu Moreira (RS)
Alexandre Guimarães (TO)
Antônio Doido (PA)
Baleia Rossi (SP)
Cleber Verde (MA)
Cobalchini (SC)
Célio Silveira (GO)
Delegado Palumbo (SP)
Dra. Alessandra Haber (PA)
Duda Ramos (RR)
Fábio Teruel (SP)
Gutemberg Reis (RJ)
Helena Lima (RR)
Hercílio Coelho Diniz (MG)
Hildo Rocha (MA)
Iza Arruda (PE)
João Cury (SP)
Juarez Costa (MT)
Keniston Braga (PA)
Lucio Mosquini (RO)
Luiz Fernando Vampiro (SC)
Marussa Boldrin (GO)
Márcio Biolchi (RS)
Newton Cardoso Jr (MG)
Olival Marques (PA)
Pezenti (SC)
Rafael Brito (AL)
Rafael Prudente (DF)
Sergio Souza (PR)
Simone Marquetto (SP)
Yury do Paredão (CE)
Novo
Adriana Ventura (SP)
Gilson Marques (SC)
Luiz Lima (RJ)
Marcel van Hattem (RS)
PDT
Afonso Motta (RS)
Max Lemos (RJ)
Márcio Honaiser (MA)
Robério Monteiro (CE)
PL
Adilson Barroso (SP)
Alberto Fraga (DF)
André Fernandes (CE)
André Ferreira (PE)
Bia Kicis (DF)
Bibo Nunes (RS)
Cabo Gilberto Silva (PB)
Capitão Alberto Neto (AM)
Capitão Alden (BA)
Carlos Jordy (RJ)
Caroline de Toni (SC)
Chris Tonietto (RJ)
Coronel Chrisóstomo (RO)
Coronel Meira (PE)
Daniel Agrobom (GO)
Daniel Freitas (SC)
Delegado Caveira (PA)
Delegado Paulo Bilynskyj (SP)
Delegado Ramagem (RJ)
Delegado Éder Mauro (PA)
Domingos Sávio (MG)
Dr. Jaziel (CE)
Eli Borges (TO)
Emidinho Madeira (MG)
Eros Biondini (MG)
Fernando Rodolfo (PE)
Filipe Barros (PR)
Filipe Martins (TO)
General Girão (RN)
General Pazuello (RJ)
Gilvan da Federal (ES)
Giovani Cherini (RS)
Gustavo Gayer (GO)
Helio Lopes (RJ)
Icaro de Valmir (SE)
Jefferson Campos (SP)
Joaquim Passarinho (PA)
José Medeiros (MT)
Julia Zanatta (SC)
Junio Amaral (MG)
Lincoln Portela (MG)
Luiz Carlos Motta (SP)
Luiz Philippe de Orleans e Bragança (SP)
Marcelo Moraes (RS)
Marcelo Álvaro Antônio (MG)
Marcio Alvino (SP)
Marcos Pollon (MS)
Mario Frias (SP)
Matheus Noronha (CE)
Mauricio do Vôlei (MG)
Miguel Lombardi (SP)
Nikolas Ferreira (MG)
Osmar Terra (RS)
Pastor Eurico (PE)
Pastor Gil (MA)
Paulo Freire Costa (SP)
Pr. Marco Feliciano (SP)
Professor Alcides (GO)
Ricardo Guidi (SC)
Roberta Roma (BA)
Roberto Monteiro Pai (RJ)
Rodolfo Nogueira (MS)
Rodrigo da Zaeli (MT)
Rosana Valle (SP)
Rosângela Reis (MG)
Sanderson (RS)
Sargento Gonçalves (RN)
Soraya Santos (RJ)
Sóstenes Cavalcante (RJ)
Vinicius Gurgel (AP)
Wellington Roberto (PB)
Zucco (RS)
Zé Trovão (SC)
Zé Vitor (MG)
PP
AJ Albuquerque (CE) – Abstenção
Afonso Hamm (RS)
Aguinaldo Ribeiro (PB)
Allan Garcês (MA)
Ana Paula Leão (MG)
André Abdon (AP)
Átila Lira (PI)
Bebeto (RJ)
Clarissa Tércio (PE)
Claudio Cajado (BA)
Covatti Filho (RS)
Da Vitoria (ES)
Delegado Bruno Lima (SP)
Delegado Fabio Costa (AL)
Delegado da Cunha (SP)
Dilceu Sperafico (PR)
Dimas Fabiano (MG)
Dr. Luiz Ovando (MS)
Eduardo da Fonte (PE)
Elmano Férrer (PI)
Evair Vieira de Melo (ES)
Fausto Pinato (SP)
João Leão (BA)
Julio Lopes (RJ)
Luiz Antônio Corrêa (RJ)
Marx Beltrão (AL)
Mersinho Lucena (PB)
Mário Negromonte Jr. (BA)
Pedro Westphalen (RS)
Pinheirinho (MG)
Ricardo Barros (PR)
Robinson Faria (RN)
Silvia Cristina (RO)
Thiago de Joaldo (SE)
Tião Medeiros (PR)
Toninho Wandscheer (PR)
Vicentinho Júnior (TO)
Zezinho Barbary (AC)
Zé Adriano (AC)
PRD
Dr. Frederico (MG)
Fabiano Cazeca (MG)
Magda Mofatto (GO)
PSB
Guilherme Uchoa (PE)
Heitor Schuch (RS)
Jonas Donizette (SP)
Lucas Ramos (PE)
PSD
Antonio Brito (BA)
Caio Vianna (RJ)
Carlos Sampaio (SP)
Castro Neto (PI)
Cezinha de Madureira (SP)
Charles Fernandes (BA)
Danrlei de Deus Hinterholz (RS)
Delegada Katarina (SE)
Diego Andrade (MG)
Diego Coronel (BA)
Domingos Neto (CE)
Dr. Ismael Alexandrino (GO)
Gabriel Nunes (BA)
Gilberto Nascimento (SP)
Hugo Leal (RJ)
Igor Timo (MG)
Ismael (SC)
Josivaldo JP (MA)
Júlio Cesar (PI)
Júnior Ferrari (PA)
Luciano Alves (PR)
Luciano Amaral (AL)
Luisa Canziani (PR)
Luiz Fernando Faria (MG)
Luiz Gastão (CE)
Marcos Aurélio Sampaio (PI)
Otto Alencar Filho (BA)
Paulo Litro (PR)
Paulo Magalhães (BA)
Raimundo Santos (PA)
Reinhold Stephanes (PR)
Ribamar Silva (SP)
Rodrigo Estacho (PR)
Sargento Fahur (PR)
Saulo Pedroso (SP)
Sidney Leite (AM)
Stefano Aguiar (MG)
Zé Haroldo Cathedral (RR)
Átila Lins (AM)
PSDB
Adolfo Viana (BA)
Aécio Neves (MG)
Beto Pereira (MS)
Beto Richa (PR)
Geovania de Sá (SC)
Lucas Redecker (RS)
Paulo Abi-Ackel (MG)
Paulo Alexandre Barbosa (SP)
Vitor Lippi (SP)
PT
Marcon (RS) (alegou que votou errado e pediu correção à mesa)
Valmir Assunção (BA)
Podemos
Bruno Ganem (SP)
Dr. Victor Linhalis (ES)
Fábio Macedo (MA)
Gilson Daniel (ES)
Luiz Carlos Hauly (PR)
Mauricio Marcon (RS)
Nely Aquino (MG)
Rafael Fera (RO)
Raimundo Costa (BA)
Renata Abreu (SP)
Rodrigo Gambale (SP)
Romero Rodrigues (PB)
Samuel Santos (GO)
Sargento Portugal (RJ)
Tiago Dimas (TO)
Republicanos
Adail Filho (AM)
Albuquerque (RR)
Alex Santana (BA)
Aluisio Mendes (MA)
Amaro Neto (ES)
Antonio Andrade (TO)
Antônia Lúcia (AC)
Augusto Coutinho (PE)
Celso Russomanno (SP)
Diego Garcia (PR)
Ely Santos (SP)
Euclydes Pettersen (MG)
Fatima Pelaes (AP)
Franciane Bayer (RS)
Fred Linhares (DF)
Gabriel Mota (RR)
Gustinho Ribeiro (SE)
Jadyel Alencar (PI)
Jeferson Rodrigues (GO)
Jorge Braz (RJ)
Jorge Goetten (SC)
Julio Cesar Ribeiro (DF)
Lafayette de Andrada (MG)
Luciano Vieira (RJ)
Marcelo Crivella (RJ)
Marcos Pereira (SP)
Maria Rosas (SP)
Messias Donato (ES)
Márcio Marinho (BA)
Ossesio Silva (PE)
Pedro Lupion (PR)
Ricardo Ayres (TO)
Rogéria Santos (BA)
Ronaldo Nogueira (RS)
Samuel Viana (MG)
Thiago Flores (RO)
Vinicius Carvalho (SP)
Wilson Santiago (PB)
Solidariedade
Aureo Ribeiro (RJ)
Zé Silva (MG)
União
Alfredo Gaspar (AL)
Benes Leocádio (RN)
Carla Dickson (RN)
Carlos Henrique Gaguim (TO)
Coronel Assis (MT)
Coronel Ulysses (AC)
Cristiane Lopes (RO)
Damião Feliciano (PB)
Dani Cunha (RJ)
Danilo Forte (CE)
David Soares (SP)
Dayany Bittencourt (CE)
Delegado Marcelo Freitas (MG)
Delegado Matheus Laiola (PR)
Dr. Fernando Máximo (RO)
Dr. Zacharias Calil (GO)
Eduardo Velloso (AC)
Fabio Schiochet (SC)
Fausto Jr. (AM)
Felipe Becari (SP)
Felipe Francischini (PR)
Fernanda Pessoa (CE)
Fernando Coelho Filho (PE)
Geraldo Mendes (PR)
José Nelto (GO)
Juninho do Pneu (RJ)
Kim Kataguiri (SP)
Leur Lomanto Júnior (BA)
Luiz Carlos Busato (RS)
Marangoni (SP)
Marcos Soares (RJ)
Maurício Carvalho (RO)
Moses Rodrigues (CE)
Murillo Gouvea (RJ)
Nicoletti (RR)
Padovani (PR)
Pastor Claudio Mariano (PA)
Pastor Diniz (RR)
Pauderney Avelino (AM)
Paulo Azi (BA)
Pedro Lucas Fernandes (MA)
Ricardo Abrão (RJ)
Rodrigo Valadares (SE)
Rodrigo de Castro (MG)
Silvye Alves (GO)
Yandra Moura (SE)