Quinta, 26 Dezembro 2024 15:14
O POVO QUER SABER

Que mercado é esse que promove ataque especulativo quando o governo toma medidas em favor do trabalhador?

 

Carlos Vasconcellos 

Imprensa SeebRio 

Para economistas neoliberais, o mercado financeiro eleva o dólar sempre que avalia um aumento futuro dos riscos de o governo, ao aumentar seus gastos, não conseguir pagar os juros da dívida pública aos bancos. No entanto, números do crescimento da economia brasileira mostram que esta possibilidade de calote está longe de ocorrer, até porque, no terceiro trimestre de 2024, a economia brasileira cresceu tanto quanto a da China e mais do que todas as maiores potências capitalistas do Ocidente. A estimativa é de que o Brasil feche o ano com crescimento de 3%, bem acima de todos os prognósticos do mercado. Com mais dinheiro arrecadado, o Brasil consegue pagar suas dívidas sem deixar de fazer os investimentos sociais necessários. Esta é a aposta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro da Fazenda Fernando Haddad fazem e o mercado financeiro parece não querer ou finge não ver por outros interesses que não os do Brasil. 

Incerteza ou ataque especulativo?

Nesta quinta-feira (26), após o Banco Central leiloar 3 bilhões de dólares (R$18,6 bilhões), a moeda americana caiu dos R$6,20 iniciais para R$6,15, mas, mesmo o país vendendo tanto dinheiro em moeda americana, fechou a manhã nos mesmos R$6,20, com seguidos recordes históricos. 

A alegação dos analistas do sistema financeiro é de que o câmbio varia conforme tendências futuras e o crescimento da inflação levou o BC a elevar ainda mais os maiores juros do mundo, chegando a 12,25%. E o pior: o mercado prevê para 2025, 14,25% de juros. Cada um ponto percentual a mais da Selic, a Taxa Básica de Juros, representa mais R$38 bilhões que o governo tem de pagar aos bancos da rolagem da dívida pública. 

Economistas progressistas denunciam que os ataques especulativos ocorrem sempre que o governo anuncia medidas em benefício dos trabalhadores, como aumento real do salário mínimo ou a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$5 mil por mês. 

"Soa estranho que o dólar dispara quando o ministro da Fazenda Fernando Haddad anunciou, junto com o pacote de corte de gastos, a isenção do IR que beneficiará 36 milhões de brasileiros a psrtir de 2026, mas não houve a mesma reação do mercado quando, contra a vontade inicial do presidente Lula, o Congresso Nacional, aprovou a desoneração na folha de pagamento para grandes empresas de 17 setores até 2027, um prejuízo de R$18 bilhões para os cofres públicos só este ano", questiona o diretor do Sindicato e secretário de Combate ao Racismo da Contraf-CUT, Almir Aguiar. 

Livre mercado?

Já medidas que prejudicam os mais pobres incluídas no pacote fiscal do governo, como limitação do aumento do salário mínimo e restrições para recebimento do BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a pessoas idosas com 65 anos ou mais e pessoas com deficiência em situação de vulnerabilidade, o mercado aprovou, mas ainda assim, achou pouco. Queria mais, cobrando inclusive uma nova reforma da Previdência. 

"Na minha avaliação, o mercado não age livremente, mas é controlado por meia dúzia de grandes capitalistas nacionais e internacionais. Veja o caso das sanções contra a Rússia em função da guerra na Ucrânia. O governo americano pegou na mão grande U$S20 bilhões de ativos russos e entregou para a Ucrânia comprar mais armas. Onde está o livre mercado nessa história? No meu vocabulário isso é roubo. Da mesma forma porque o dólar só sobe quando o governo anuncia medidas que beneficiam os trabalhadores?", questiona o diretor do Sindicato, Sérgio Menezes. 

Aumento do salário mínimo 

O governo Lula propôs para 2025, um aumento de 6,87% para o salário mínimo., passando dos atuais R$1.412 para R$1.509 o que representa, tirada a inflação, um aumento real de 2,91%. Fica a pergunta: será que o mercado vai reagir a esse reajuste com mais um ataque especulativo? 

"O Brasil tem o 4⁰ pior salário mínimo da América Latina, apesar de ser, de longe, a maior economia da região. O que o tal mercado quer? Que o povo passe mais fome para agradar a banqueiros e especuladores como faz o atual presidente da Argentina, Javier Milei?", critica Menezes.

Quem ganha com dólar alto?

Mas se o povo perde com a alta recorde do dólar - produtos como o trigo para produzir pão e pizza são importados na moeda americana - e a desvalorização do real reduz o poder de compra, quem ganha com os ataques especulativos? 

Quanto mais sobe o dólar, maior é o faturamento de grandes especuladores que investem parte de seu dinheiro em paraísos fiscais, como é o caso dos banqueiros e, como exemplo, do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, que deixará o cargo a partir de 2025.

Os bancos faturam ainda mais, pois com a alta do dólar, o Copom (Comitê de Política Monetária) eleva ainda mais os juros no país, aumentando em algumas dezenas de bilhões de reais, o dinheiro pago pelo governo às instituições financeiras para a rolagem da dívida e nos financiamentos para pessoas físicas e empresas. 

Os EUA também faturam com a atual regra cambial global e o chamado câmbio flutuante no Brasil criado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, no lançamento do Plano Real. Ao vender U$S3 bilhões em reservas o BC brasileiro tenta segurar a alta do dólar e, com isso, o governo americano fortalece ainda mais a sua moeda e, por conseguinte, a sua economia, garantindo a emissão de trilhões de dólares mundo à fora, sem gerar inflação interna, o que garante ao governo americano, manter seus gastos públicos crescentes e a rolagem de uma das maiores dívidas públicas do Planeta: U$S34 trilhões, mais de R$210 trilhões. Só para se ter uma ideia, a dívida pública brasileira chegou em novembro deste ano, a R$7,2 trilhões, embora o PIB (Produto Interno Bruto) dos EUA seja 13 vezes maior do que o do Brasil. 

Este ganho absurdo dos EUA com a convenção do dólar como referência internacional no comércio global (até a segunda guerra mundial era o ouro) vem sendo questionado pela China e os países do Brics, que defendem a comercialização em moeda local de quem vende, o que acabaria com a hegemonia da moeda americana no Planeta e poderia levar a uma crise econômica dos EUA sem precedentes na história. Sem a emissão trilionária de dólares no exterior, o governo americano teria sérias dificuldades para o pagamento de sua dívida pública. 

Como se vê, quem tem o dólar para especular e promover ataques especulativos contra as moedas alheias, tem tudo.

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