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Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Nesta última matéria da série especial “Ditadura nunca mais”, marcando os 60 anos do golpe militar de 1964 que derrubou o governo democrático de João Goluart e implantou 21 anos de regime militar autoritário, apresentamos um depoimento vivo de quem viveu aquele período dramático da vida brasileira: Fernanda Carisio, bancária do Banco do Brasil, que foi presidenta do Sindicato dos Bancários do Rio e da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), o embrião da Contraf-CUT, a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro.
Uma história de luta
Fernanda começou a militar na política ao entrar para a universidade em 1972. Entrou para a faculdade de jornalismo na PUC, onde iniciou sua militância no então Partido Comunista Brasileiro (PCB), transferindo-se depois para a UFF (Universidade Federal Fluminense).
Continuou militando no movimento estudantil e ingressou na Fração Bolchevique da Política Operária, que posteriormente veio a realizar seu primeiro congresso e a se denominar Movimento pela Emancipação do Proletariado (MEP). Ao passar no concurso para o Banco do Brasil se aproximou do movimento sindical bancário. Como jornalista, trabalhou durante alguns anos na Tribuna da Imprensa, o último jornal a contar com a presença de censores diretamente na redação, assediando os jornalistas e censurando abertamente o jornal
Prisão e tortura
Em julho de 1977, Carisio e vários militantes do MEP foram presos pela ditadura militar. “Ficamos dez dias incomunicáveis no Quartel da Polícia do Exército da Barão de Mesquita e fomos submetidos à tortura e ao isolamento total”, relata. Ela foi libertada em setembro de 1977, continuou a militância no movimento estudantil e no sindicalismo bancário. Enfrentou, junto com todo o movimento sindical, a partir de 1978, as intervenções da ditadura militar ou direções claramente patronais e vinculadas ao regime.
Repressão aos trabalhadores
Participou da organização do processo eleitoral a fim de reconquistar o sindicato dos bancários para as mãos dos trabalhadores. “Qualquer tentativa de luta, de questionamento aos baixos salários ou a falta de condições mínimas de trabalho ou de organização dos trabalhadores era duramente reprimida. Um exemplo claro dessa repressão foi a intervenção em nosso Sindicato, a perseguição dos dirigentes, com o exemplo mais flagrante de Aluízio Palhano perseguido e morto pela ditadura militar”, lembra Fernanda.
O valor da democracia
Às gerações mais novas, que não viveram e desconhecem o que é uma ditadura, Fernanda Carisio faz um alerta.
“Quem acha que a vida era melhor, realmente, ou tem muito pouca memória ou está muito mal informado. As mobilizações que se iniciaram no ABC e correram como rastilho de pólvora gerando mobilizações de trabalhadores em todo país, tiveram como principais bandeiras as conquistas econômicas. O arrocho salarial era violento. Direitos que hoje consideramos como ‘naturais’ não existiam. Nada de auxílio transporte, auxílio alimentação e refeição, auxílio creche, planos de saúde, abonos, PLR então nem pensar” explicou.
“A inflação absurda chegou a mais de 80% ao mês. Quem pode ter saudade dessas coisas? Enquanto isso os ditadores de plantão falavam em ‘Brasil ame-o ou deixe-o’, em obras faraônicas, nunca concluídas como a Transamazônica e que consumiam rios de dinheiro em mamatas e muita corrupção. E tudo isso sob forte censura da imprensa buscando tapar o sol com a peneira”, critica.
“Com o aumento das lutas dos trabalhadores por melhores condições de trabalho e de vida e por democracia e eleições livres, essas fanfarronices foram sendo desmascaradas. A democracia e a liberdade de organização e manifestação são essenciais para que tais situações não se repitam nunca mais. Precisamos conhecer nossos direitos, saber como conquistamos cada um deles, para que possamos mantê-los e avançar em novas conquistas”, conclui a sindicalista.