EXPEDIENTE DO SITE
Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Carlos Vasconcellos
A "empresa" Brasil Paralelo, grupo de extrema-direita, está divulgando um vídeo da série "Face Oculta", apresentada por um tal de Cesar Almir em que promove verdadeiras calúnias contra a imagem do ex-governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, Leonel de Moura Brizola. Dando voltas na trajetória do gaúcho, a produção não foi capaz de esconder o papel relevante do político gaúcho na defesa da democracia e no enfrentamento, colocando em risco a própria vida, ao golpe que os militares queriam impor ao país em 1961, contra João Goulart, que amparado pela Constituição Federal, deveria assumir o cargo de presidente após a inusitada renúncia do controverso Jânio Quadros. É mostrada na produção, a Campanha da Legalidade, em que numa mobilização popular armada no Palácio Piratini, em Porto Alegre, o então governador gaúcho recebe o apoio do general Machado Lopes, que comandava o Terceiro Exército, para as garantias constitucionais e a posse de Jango, que na ocasião se encontrava em missão diplomática na China. A decisão corajosa e legítima do militar contra os generais golpistas garantiu a posse de Goulart e a democracia ao apoiar o levante armado de Brizola. Mas a série lembra que Brizola, após a posse de Jango, queria que o presidente bradileiro marchasse até Brasília com o Terceiro Exército, fechasse o Congresso Nacional e realizasse eleições para criar uma nova Constituinte
Brizola, um revolucionário
Sim, Brizola era um revolucionário de esquerda. E se Jango tivesse aceito sua proposta, talvez o Brasil tive8sse conseguido abortado o golpe que viria em 1964 e os 21 anos de ditadura militar apoiados pelos EUA.
A programação narra ainda sobre o maior projeto de educação pública em horário integral do país, os Cieps, uma proposta de educação libertária construída com Darcy Ribeiro e o projeto arquitetônico de Oscar Niemeye que, na verdade, era um aperfeiçoamento do que Brizola já fizera no Rio Grande do Sul, construindo seis mil escolas em horário integral nos anos 60.
Versão caluniosa
A partir destes registros históricos, a produção começa a dar sua versão mentirosa e caluniosa contra Brizola, sem nenhuma fundamentação histórica.
Primeiro insinua que Brizola teria recebido US$1 milhão de Fidel Castro para organizar a guerrilha do Alto Caparaó, em Minas Gerais, tentativa que foi desmantelada em seu embrião, com a prisão dos sargentos e demais membros da primeira resistência armada contra a ditadura militar. E o narrador volta a atacar com o folclore propositadamente criado pelo regime militar e repetido por setores da imprensa e até por parte da esquerda de que Fidel Castro se referia a Brizola como "El Raton", calúnias que foram desmentidas pelo próprio líder revolucionário cubano, que tinha em Brizola, um amigo.
Na ocasião da morte de Brizola, em 2004. Fidel Castro divulgou uma nota dizendo: "Em tempos difíceis como os que a humanidade enfrenta atualmente, Brizola será referência obrigatória para os lutadores nacionalistas e antiimperialistas. Desde muito jovem Brizola se destacou pelas suas firmes posições nacionalistas e foi, sem dúvida nenhuma, um dos precursores do avanço político e democrático presente hoje no Brasil".
A homenagem e reconhecimento de Fidel a Brizola, claro, o narrador caluniador da Brasil Paralelo omitiu a fim de sustentar a falácia fomentada pela ditadura militar que visava atingir e desmerecer a imagem do líder trabalhista.
O próprio regime militar, que vasculhou de todo o jeito a vida do político gaúcho, reconheceu a integridade e honestidade de Brizola, fato confirmado até por seus mais ferrenhos adversários políticos.
O respeito, reconhecimento e admiração a Brizola ultrapassou as fronteiras do Brasil, quando durante seus 15 anos de exílio, foi celebrado e hokenageado por líderes e dirigentes estrangeiros da social-democracia europeia e do trabalhismo do mundo inteiro, como François Miterrand, da França, Willy Brandt da Alemanha e Mário Soares, de Portugal.
Brizola e a violência no Rio
A outra calúnia do narrador estimula um injusto estigma criado pela grande mídia, especialmente pelas Organizações Globo, insinuando que Brizola, ao defender uma política de direitos humanos nas favelas, dando às regiões pobres o mesmo tratamento dado aos bairros mais nobres da cidade no respeito às leis e aos direitos do cidadão, teria sido responsável pela expansão do crime organizado e pela violência no Rio de Janeiro, questão complexa que hoje vemos, é um problema nacional de causas absolutamente ligadas às desigualdades econômicas e sociais no país e a marginalização dos mais pobres.
A despeito da acusação, Brizola trazia sempre a capa de uma Revista Veja de 1981, um ano antes dele assumir o governo do Rio, que estampava a seguinte manchete : "A Guerra Civil no Rio", com imagens da violência no Rio em pleno regime militar.
Os militares e o crime organizado
A produção da extrema-direita não conta também que o crescimento da violência e do crime organizado no Rio ocorre, de fato, antes de Brizola ganhar as eleições para governador em 1982 e assumir o governo do Rio.
Foi no cerne da ditadura militar que a Falange Vermelha, que deu origem ao Comando Vermelho, se organizou e grande parte do armamento do crime organizado veio e vem ainda hoje do próprio Exército brasileiro com a corrupção de membros do alto escalão através do desvio de armamento que foram parar nas mãos dos traficantes do Rio.
Um exemplo mais recente desta relação do fortalecimento do aparato de armas pesadas do tráfico de drogas e do envolvimento de militares com o crime organizado foi o caso do avião presidencial no governo Jair Bolsonaro (PL), em 2019, em que foram apreendidos 39kg de cocaína no avião da FAB (Força Aérea Brasileira). Claro, com o conhecido corporativismo da Justiça Militar no Brasil, que blinda coronéis e generais, apenas o sargento Manoel Silva Rodrigues foi condenado a 14 anos de prisão e se encontra solto em Sevilha, na Espanha.
Não é necessário explicar porque o narrador da Brasil Paralelo omite estes fatos e estas relações perigosas.
O vídeo não conta também que o governo Brizola combateu como nenhum outro os grupos de extermínio no Rio de Janeiro, organização criminosa de policiais à serviço de empresários que deram origem às milícias no Rio. Claro que falar das milícias não é uma boa opção para a imagem da Brasil Paralelo. É pública e notória a relação estreita da atual extrema-direita brasileira com milicianos, por isso o narrador do vídeo sequer fala nesta organização criminosa.
A narrativa omite também que foi no regime civil-militar que a cúpula do Jogo do Bicho atingiu o ápice de seu poder, com envolvimento de agentes policiais e do Exército de repressão do próprio governo. Não por acaso, o militar e contraventor Aílton Guimarães Jorge, o Capitão Guimarães, foi citado no relatório final da Comissão Nacional da Verdade e apontado como torturador, investigado por graves violações aos direitos humanos contra presos políticos no Doi-Codi do Rio de Janeiro e na 1ª Cia da Polícia do Exército da Vila Militar. Imagina se a Brasil Paralelo iria citar este vínculo da ditadura militar com a contravenção e as organizações criminosas.
Brizola tinha razão
Basta ver a violência de hoje no Rio de Janeiro e nos demais centros urbanos do país para verificar que Leonel Brizola tinha razão ao afirmar que de nada adianta combater o tráfico de drogas apenas com o recrudescimento do aparato policial e militar se não forem combatidas as causas do problema: a violenta desigualdade econômica e social do Brasil e a necessidade de uma educação pública de qualidade para todas as crianças e jovens, com alimentação, práticas de esporte e culturais e potencialização dos direitos de cidadania e da consciência da realidade, além da geração de empregos e renda.
O presidente Lula, recentemente, fez um reconhecimento de que Brizola estava certo quanto a urgência da necessidade da educação de qualidade e em horário integral para o desenvolvimento do Brasil.
Na época de Brizola, a violência no Rio tinha um caráter infantojuvenil. Eram muitos daqueles adolescentes e jovens, abandonados nas ruas e que realizavam pequenos furtos, os conhecidos arrastões, que se tornariam os chefes do varejo do tráfico de drogas nas favelas. Sim, varejo. Afinal, os poderosos e verdadeiros chefões do tráfico estão nas elites e no aparato militar do estado e estiveram até, recentemente, a frente do governo federal de extrema-direita comandado por militares.
Acusar Brizola de responsável pela violência no Rio, hoje infinitamente em situação mais grave, e pasmem, "responsável pelas mortes" no drama da violência do Rio, estigma sustentado pela grande mídia desde que o líder trabalhista assumiu o governo do Rio, em 1982, é uma mentira deslavada e uma calúnia. Uma violência contra os fatos e a história.
Esta narrativa não se sustenta mais nem mesmo entre aqueles que eram opositores de Brizola.
Hoje não há uma pessoa sensata, nem mesmo da direita liberal, que não reconheça que Brizola tinha razão na prioridade à educação.
A pacificação social só é possível com uma educação pública integral libertária de qualidade, desenvolvimento econômico com igualdade de oportunidades e justiça social, tudo o que a extrema-direita, seja nos 21 anos de ditadura militar ou no governo eleito do miliciano Jair Bolsonaro (PL) não fizeram, tornando o Brasil mais desigual, o povo mais miserável e marginalizado e os grandes centros urbanos, não somente o Rio de Janeiro, cada vez mais violentos.
Como eles imaginam que países como Noruega, Islândia e Suécia atingiram os mais altos índices de pacificação social e qualidade de vida de seu povo?
Em defesa de Brizola
Brizola não está mais entre nós para se defender. Se tivesse, desmascararia as falácias e calúnias da Brasil Paralelo, que possui uma poderosa gama de produções caras e refinadas para reescrever a história com sua versão tosca e falaciosa, numa estratégia de comunicação que lembra o estilo da comunicação da propaganda nazista de Joseph Goebes.
Mas é preciso também investigar a outra "Face Oculta" do fascismo no Brasil: quem está financiando a Brasil Paralelo?
Cabe ao PDT tomar as devidas providências legais contra as fake news da Brasil Paralelo que desvirtuam a história e caluniam a imagem de um brasileiro que teve uma vida pública ilibada e uma trajetória inteira marcada pela coragem e obstinação em defesa da democracia, da soberania nacional e de um país justo e com oportunidades iguais para todos.
Não é por acaso que 20 anos após a sua morte, Brizola incomoda tanto a direita. Ele era uma voz contundente em defesa dos mais pobres e desvalidos, dessa massa sem voz e sem vez neste país rico de povo miserável e marginalizado.
Cabe ainda a toda a sociedade democrática, do meio acadêmico, do jornalismo, da política e dos meios estudantis e sindicais, uma reação e uma resposta.
Brizola é um dos mais proeminentes heróis da Pátria. E não será um grupo de fascistas engomadinhos que irão apagar sua dignidade e trajetória.