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Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Olyntho Contente*
Imprensa SeebRio
A falta de uma ação mais rápida que evitasse a interrupção do fornecimento de energia em pelo menos 25 estados do país, nesta terça-feira (15/8), pode estar ligada ao desmonte da Eletrobrás, que começou antes mesmo da sua privatização, em junho de 2022, às vésperas da eleição. A empresa é a maior do setor elétrico brasileiro, com cerca de um terço da capacidade de geração de energia e mais de 73,8 mil quilômetros de linhas de transmissão, mas, com a privatização, abandonou seu protagonismo na garantia do funcionamento do setor e sua relação antes estreita com seu antigo controlador, o governo federal.
Um sinal mais do que evidente deste afastamento da empresa, desde a sua privatização, do Ministério das Minas e Energia, foi a troca de seu presidente, que ocorreu na véspera do apagão, fato que a Eletrobrás não comunicou ao governo. “Soubemos pela imprensa”, comentou o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, em coletiva concedida nesta terça-feira (15/8), em que prestou esclarecimentos sobre o apagão.
O incidente
Silveira disse que a linha causadora do blackout, localizada no estado do Ceará, pode ser de responsabilidade da empresa, outro exemplo do afastamento da ex-estatal. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) já identificou uma “sobrecarga” na rede elétrica do Ceará como uma das causas do apagão.
Quando o fato ocorreu, o sistema desligou a passagem de energia entre as regiões Norte/Nordeste e Sul/Sudeste, para evitar que a causa gerasse danos maiores. O ministro disse que além da sobrecarga no Ceará, teria que haver outro evento “concomitante” para levar ao desligamento do sistema, o que é muito raro acontecer.
Por isto mesmo, não afastou a possibilidade de atos ilícitos, ou seja, a ocorrência de sabotagem. O Ministério da Justiça, através da Polícia Federal, e a Agência Brasileira de Informações (Abin), estão investigando as causas, a pedido do Ministério das Minas e Energia
Desmonte
Desde que foi privatizada, em junho do ano passado, a Eletrobrás já cortou cerca de 2.500 trabalhadores. No entanto, os desligamentos desenfreados começaram ainda no governo Bolsonaro, como preparação da privatização, concluída ao final do mandato. Entre 2018 e 2022, a Eletrobrás registrou queda de quase 40% em seu quadro de empregados, a maior parte na área operacional.
“Precisamos olhar em perspectiva. Trabalho na área de manutenção da Eletronorte (subsidiária da Eletrobras), tenho conhecimento sobre o que estou dizendo. As pessoas que estão trabalhando lá, o que nós estamos vendo hoje, é uma situação de desespero. Porque não tem gente para trabalhar, não tem gente para poder fazer a manutenção”, alertou o engenheiro eletricista Ikaro Chaves, ex-dirigente sindical e ex-conselheiro eleito do Conselho de Administração (Consad) da Eletronorte.
Para o Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE), formado por entidades sindicais que representam os empregados da Eletrobrás, a privatização pode ser uma das causas do incidente que deixou sem luz quase todo o país. O argumento também é o de que a principal empresa do setor elétrico, desde antes da privatização, vem sofrendo um processo de demissões em massa e enxugamento de sua estrutura, o que o governo Bolsonaro chamou de ‘desinvestimento’, buscando baratear a sua venda.
Para o CNE, a demora para a divulgação da causa do apagão que afetou as regiões Norte e Nordeste, além de outras localidades nas demais regiões do país, é também reflexo da privatização. Em nota o CNE diz que a identificação das causas poderá demorar mais devido à falta de quadros técnicos experientes e capacitados alvos dos desligamentos (de pessoal) desenfreados por parte da Eletrobras”.
Os eletricitários lembram que na ocasião dos vandalismos em torres de transmissão, em janeiro deste ano, a própria direção da Eletrobrás foi obrigada a retardar a saída de quadros técnicos experientes para lidar com a situação.
Eletrobrás troca presidente na véspera
Em teleconferência com analistas sobre dados do segundo trimestre deste ano, o então presidente da empresa Wilson Ferreira Jr. admitiu que a saída de empregados poderia ser adiada por falta de substituição. Ferreira pediu demissão na véspera do apagão, sendo substituído no cargo por Ivan Monteiro, presidente do Conselho de Administração da companhia, que, ao contrário de Ferreira Jr., desconhece o setor elétrico e teria ligações com o grupo de acionistas da 3G Capital.
A 3G é uma empresa brasileira-estadunidense de private equity, fundada em 2004 por Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira. Os três são donos das Lojas Americanas, e estão envolvidos no episódio de fraude na contabilidade da empresa varejista.
De acordo com os eletricitários, foram feitos vários alertas sobre os riscos das demissões e, no último dia 20 de julho, o próprio Ministério de Minas e Energia pediu a suspensão das demissões, preocupado com o sistema elétrico brasileiro, devido à saída de profissionais qualificados e os reflexos para a prestação de serviços. Até o momento, porém, não houve resposta.
“Apesar de reconhecer a fragilidade, falou mais alto o discurso de redução de despesas com pessoal. Essa é a triste realidade imposta pela privatização inconsequente da Eletrobrás”, disse o CNE.
*Com informações do Brasil de Fato, CNE e Infomoney.