Sábado, 05 Agosto 2023 17:44

Tributação injusta e juros do sistema financeiro são os maiores problemas do Brasil, diz Berzoini

Ex-ministro dos governos Dilma e Lula diz que movimento sindical precisa mobilizar e conscientizar os trabalhadores quanto à relevância destes temas
O ex-ministro e bancário Ricardo Berzoini disse que não há saída para o Brasil se não ocorrer uma ruptura com o atual modelo tributário e financeiro O ex-ministro e bancário Ricardo Berzoini disse que não há saída para o Brasil se não ocorrer uma ruptura com o atual modelo tributário e financeiro Foto: Nando Neves

Carlos Vasconcellos

Imprensa SeebRio

O ex-ministro nos governos Dilma e Lula, Ricardo Berzoini, primeiro presidente da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), trouxe uma análise política sobre a reforma tributária que tramita no Congresso Nacional.

“A economia brasileira tem duas ‘bolas de ferro’: uma é a política tributária e a outra é o sistema financeiro. Digo sem medo de errar que ambos possuem os piores modelos do mundo”, criticou.

“Por mais que a gente faça lutas importantes, se não enfrentarmos estas duas questões, não vamos conseguir superar os desafios em nosso país. E não será o governo Lula, sozinho, que vai conseguir superar estes impasses, mas sim, a  participação e a mobilização popular”, acrescentou Berzoini.

Brasil na contramão do mundo

O ex-ministro lembrou que o Brasil é o único lugar do mundo em que, quem fatura mais dinheiro não paga imposto, citando os lucros e dividendos, que não são taxados desde o governo de Fernando Henrique Cardoso.

“Outro absurdo é a distribuição de juros sobre capital próprio. Somente quem declara lucro real pode distribuir metade do lucro como se fossem juros, para pagar menos impostos, 15% em vez de 34%. É preciso tributar as grandes empresas, como o agronegócio, os bancos e as grandes heranças no Brasil”, opinou, destacando que, nos EUA, heranças chegam a ser taxadas em 40%, enquanto que no Brasil, este imposto se limita a 8%.

“Tudo isso são elementos que são o coração da desigualdade. Nosso sistema tributário propaga a desigualdade. Se queremos um país mais igual temos que aprovar uma nova política tributária. A atual é só um pedaço dela, é importante para simplificar e combater a guerra fiscal, mas defendemos equiparar o nosso sistema tributário ao dos EUA, da Alemanha e da Inglaterra, matrizes do capitalismo. Todos estes países tributam dividendos e pesadamente as grandes heranças e o nosso país precisa ao menos se equiparar a eles”. Defendeu a elevação da isenção no Imposto de Renda para quem recebe salário de cinco, seis ou até oito mil reais por mês e tributar os mais ricos, lembrando que nos países escandinavos, as alíquotas para os mais ricos variam de 57% a 65%.

Necessidade de mobilização

Berzoini destacou o papel relevante do movimento sindical nestes desafios do país, especialmente na questão tributária e dos juros. 

“Nossa atitude, da CUT e demais centrais sindicais, deve ser a de mobilizar a população nas ruas para que saia uma reforma justa”, afirmou, defendendo uma tributação progressiva, como ocorre nas nações capitalistas mais desenvolvidas. Disse ainda que, apesar dos esforços do atual governo, o país precisa avançar mais, criando uma justiça tributária.

“Lula e Haddad estão indo muito bem. O arcabouço fiscal não é o melhor, mas é o que foi possível. No Congresso Nacional a situação é muita complicada e temos que mobilizar a classe trabalhadora. A vitória só será possível neste caso, que é o de conseguir alinhar o Brasil ao resto do mundo para ampliar a isenção da alíquota no IR e para as pequenas e micros empresas e taxarmos as grandes rendas, criando consciência política sobre o tema”, afirmou, lembrando que 70% das receitas da Europa, Ásia e America do Norte provêm da taxação sobre a renda e o patrimônio e não de impostos sobre o consumo, como ocorre no Brasil.

“Nos EUA há imposto de renda federal e estadual, que chega a 47% em caso dos maiores salários, como os de grandes executivos de empresas”, explicou, defendendo ainda um IPTU progressivo também para tributar os mais afortunados e aliviar a carga tributária sobre pobres e a classe média.   

“O atual governo só deverá apresentar a proposta sobre tributação da renda no ano que vem. Temos tempo para um trabalho de base, discutir com os trabalhadores, construir consciência e mobilização e organizar manifestações em defesa de justiça tributária.  

Lógica neoliberal

Berzoini criticou ainda o fato de prevalecer em cargos executivos de bancos públicos, a lógica neoliberal.

“O segundo escalão é formado na lógica neoliberal, financista, que conduz a venda de produtos como a previdência privada e impõe sobre bancários metas desumanas.  As vezes, no Banco do Brasil o agronegócio tem mais moral do que a agricultura familiar”, criticou, dizendo ainda que os juros cobrados no Brasil são “indecentes”.

“Se não avançarmos nestas questões, vamos permanecer meramente como o país do agro, da mineração e de algum outro setor. Temos que aprender com a China em relação ao domínio da inovação, país que saiu dos anos 80 numa situação mais atrasada que o Brasil e hoje disputa a hegemonia tecnológica e econômica com os EUA”, concluiu.  

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