Quarta, 26 Abril 2023 18:24
SEM JUSTIFICATIVA

Campos Neto não convence e culpa governo e população por juros altos

Explicações no Senado Federal para manutenção de Selic em 13,75% resultam em críticas de parlamentares e causam indignação na sociedade
Legenda: Roberto Campos Neto defendendo manutenção dos juros altos: explicou, mas não justificou e não convenceu ninguém Legenda: Roberto Campos Neto defendendo manutenção dos juros altos: explicou, mas não justificou e não convenceu ninguém Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Carlos Vasconcellos

Imprensa SedebRio

Com informações da EBC e da Contraf-CUT

Na avaliação do presidente Luis Inácio Lula da Silva, de economistas, inclusive liberais como Persio Arida, um dos fundadores do Plano Real, de empresários e da própria população, não há nada que justifique o Banco Central manter a Selic (taxa básica de juros) em 13,75%, até porque, a inflação no Brasil neste momento não é de demanda. Apesar das críticas e da mobilização do movimento sindical cobrando juros mais baixos, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, insiste em manter taxas elevadas. Em audiência pública que durou cinco horas na última terça-feira (25), no Senado Federal, o executivo que trabalhou 18 anos no Santander, tentou transferir responsabilidade pelos juros elevados para o governo e para população. O economista, ligado ao sistema financeiro privado, contrariou a versão da maior parte dos especialistas, dizendo que a mais alta taxa de juros do mundo seria porque “grande parte da inflação no país é provocada pelo consumo”. Campos Neto sequer citou consequências externas, como a guerra entre Ucrânia e Rússia e a crise climática global para fundamentar seus argumentos. Culpou ainda o governo, alegando que “o mercado está preocupado e inseguro com a política fiscal”. Ele citou “como bom exemplo”, na sua avaliação, o ano de 2016, quando “o mercado se comportou de forma positiva devido à credibilidade do teto de gastos”, elogiando a medida tomada durante o governo de Michel Temer (MDB) que, sem precedentes no mundo capitalista, paralisou impede investimentos fundamentais para a retomada do desenvolvimento econômico.

“Quando você tem esse tipo de queda [nas contas públicas], abre espaço para o Banco Central diminuir os juros”, argumentou.

Repercussão negativa

Para a presidenta da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) e vice-presidenta da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Juvandia Moreira, “o que Campos Neto não contou é que a regra fiscal do teto de gastos é tão impraticável para o desenvolvimento econômico e social do país que impediu o repasse de dezenas de bilhões para setores fundamentais, incluindo Educação e Saúde”.

“Mas tudo isso não preocupa o mercado. O que preocupa o mercado é o quanto pode ganhar ou perder com os títulos públicos, que são influenciados pela Selic”, acrescentou Juvandia.

O presidente do BC voltou as cargas contra o governo Lula ao transferir para o Palácio do Planalto a responsabilidade pelo patamar elevado da Selic, porque, segundo o tecnocrata, “o nível alto da dívida bruta reflete nas taxas de juros, que reflete na previsão de risco futuro”, e acrescentou dizendo que a “responsabilidade pelo elevado spread” (diferença entre a taxa de juros cobrada pelos bancos nos empréstimos e financiamentos) é causado pela “inadimplência” da população.

“São os juros altos que elevam a inadimplência e não o contrário. Nada justifica este patamar de juros, os maiores do planeta. E na ponta da Selic estão os juros praticados pelos bancos privados que endividaram mais de 60 milhões de trabalhadores e levam 52 milhões de brasileiros a recorrer ao cartão de crédito para comer e sobreviver”, criticou a vice-presidenta do Sindicato dos Bancários do Rio, Kátia Branco.  

Em outras palavras, os bancos aumentam o spread para compensar o crédito emprestado não recuperado.

Aula de economia

Com um giz e um quadro negro, o senador Cid Gomes (PDT-CE) deu uma aula de economia para Campos Neto. Mostrou em minutos, o que o presidente do BC não conseguiu justificar em cinco horas, lembrando que, em 2022, a inflação no Brasil foi de 5,8% e a taxa Selic terminou o ano em 13,75%. Enquanto nos Estados Unidos, o Federal Reserve Board (FED), banco central daquele país, estipulou uma taxa básica de juros em 4,5% no final de 2022, apesar de a inflação média norte-americana ter ficado em 6,5% durante o ano. Ao final, o senador pedetista comparou as consequências das duas políticas de juros dos respectivos bancos centrais: a taxa de desemprego nos EUA estava em 3,5% contra 9,5% no Brasil.

Aumento da dívida pública

Cid Gomes lembrou ainda que praticamente metade da dívida pública brasileira está atrelada à Selic e, por causa disso, em 2022, a União desembolsou R$ 802 bilhões. “Então, a conta que eu faço é que se o Brasil praticasse a taxa de juros da ‘meca do capitalismo’, que é a americana, nós teríamos despendido R$ 292 bilhões com a dívida pública. Com esta diferença de R$ 510 bilhões, seria possível triplicar o valor do Bolsa Família, acabar com o déficit de habitação popular em dois anos ou com o déficit de escolas em três anos. Poderíamos também usar esse recurso para triplicar o valor do salário-mínimo”, destacou Cid Gomes.

“Juros altos, além de comprometer as finanças públicas, comprometem a disposição da iniciativa privada de investir e isso é que gera inflação de oferta", completou.

O líder do PT no Senado, Fabiano Comparato (PT-SE), lembrou que um dos objetivos legais do BC é fomentar o pleno emprego e que a aplicação indiscriminada da taxa básica de juros sobre toda a população e todos os setores econômicos têm seus efeitos mais perversos sobre os pobres. “O presidente do Banco Central sabe quanto custa um litro de leite, um quilo de arroz, um quilo de feijão? Nós temos que sair da Faria Lima e interagir com a população que mais precisa”, criticou.

A fraca apresentação de Campos Neto recebeu críticas também no ninho tucano.

“Por causa desta Selic, o juro real está em torno de 8%. Com isso eu pergunto, qual é o empresário no Brasil que vai tomar empréstimo com este juro?”, questionou o senador Otto Alencar (PSDB-BA).

 

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