Contrários à construção da tirolesa no Pão de Açúcar, um grupo de manifestantes se mobilizou, neste domingo, na Praia Vermelha, onde pediram a revisão, pelas autoridades competentes, dos estudos e documentos do novo projeto do Parque Bondinho. Entre as exigências feitas, destaca-se maior transparência por parte da empresa, acusada no protesto de omitir informações importantes para o andamento das obras e que podem ameaçar o meio ambiente.
A tirolesa, atrativo de 395 metros de altura e com velocidade de 100km/h, vai ligar os Morros da Urca e Pão de Açúcar, sendo, segundo a empresa, um complemento à contemplação do ponto turístico. O projeto começou a ser discutido em 2020 e, agora, está em fase inicial de construção. O Parque Bondinho aposta na inauguração durante o segundo semestre deste ano.
Contudo, o descontentamento dos manifestantes não se restringe à tirolesa. Para eles, a construção representa um retrocesso nas medidas de preservação ambiental, principalmente porque os morros em questão são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e reconhecidos como Patrimônios Mundiais pela Unesco.
Manifestantes protestam contra a construção da tirolesa — Foto: Guito Moreto
Segundo Sérgio Alvim, arquiteto e representante do “Movimento Bondinho sem tirolesa”, o projeto de construção começou pouco transparente e contraditório, já que, inicialmente, o Parque Bondinho alegava não gerar danos ambientais nos morros, mas, agora, é possível observar perfurações nas rochas.
— As documentações disponibilizadas pela empresa não oferecem todos os dados necessários para analisar os riscos. Os representantes dizem que não vão aumentar a área construída do Bondinho, mas o próprio projeto prevê modificações. Quem faz a trilha do Morro da Urca consegue ver as rochas perfuradas. Como deixam fazer isso em um espaço de conservação reconhecido mundialmente?
Ana Paula Vizintini, que representa o movimento juridicamente, reforça que houve pedido de ação contra a construção perante o Ministério Público Federal.
— Nós varremos todos os documentos e processos relacionados à tirolesa, e podemos dizer que há evidências contundentes de danos aos patrimônios, sejam ambientais, paisagísticos, entre outros.
Já o Parque Bondinho esclarece que todas as etapas da construção “foram devidamente aprovadas por todos os órgãos licenciadores”.
"Não é só pela tirolesa"
Escopo do "Plano diretor", projeto futuro do Parque Bondinho e aberto a modificações. — Foto: Reprodução
Durante o protesto, os manifestantes reforçaram que a tirolesa é o pontapé inicial para uma série de transformações no Pão de Açúcar. Para a afirmação, eles usam como base um documento chamado "Plano diretor", produzido pelo próprio Parque Bondinho e que mostra o futuro do ponto turístico: além do mirante, das lojas de souvenirs e restaurantes atuais, o novo projeto prevê a ampliação de bares, lojas de varejo, teatro, infraestrutura para atrativos semelhantes à tirolesa e espaço melhor estruturado para shows, que já acontecem atualmente.
De acordo com os manifestantes, as melhorias previstas no documento refletem em uma expansão de 50% da área construída no Pão de Açúcar, que recebe interferência humana há 110 anos.
Sobre a tirolesa, eles criticam as perfurações nas rochas, que podem intensificar o processo de erosão, o aumento do barulho, que pode afetar tanto os animais quanto os turistas e moradores, além da descaracterização do local, tombado e reconhecido exatamente pelas condições atuais.
O que diz o Parque Bondinho
Em nota oficial compartilhada com a imprensa, o Parque Bondinho reitera o "compromisso com o meio ambiente e ressalta que no projeto da tirolesa estavam previstas intervenções mínimas em rocha, e todas foram aprovadas para serem executadas em áreas dentro do limite do Parque, que anteriormente já foram objeto de outras ações humanas. Houve, recentemente, uma interrupção das atividades em rocha, que foram acordadas com a Secretaria Municipal do Ambiente e Clima (SMAC) visando a obtenção de análise adicional, que está em andamento. Porém a Geo-Rio já concedeu parecer favorável ao projeto da tirolesa, emitindo a licença para as atividades”.
Sobre o "Plano diretor", a empresa justifica afirmando ser uma "proposta conceitual", ou seja, apenas uma ilustração das melhorias que o espaço necessita, já que está com goteiras, demandando modernização e maior acessibilidade.
"O projeto da tirolesa não tem qualquer relação com a proposta conceitual contida no Plano Diretor. A obra da tirolesa foi objeto de mais de dois anos de estudos e análises, e hoje encontra-se totalmente aprovada por todos os órgãos licenciadores, e somente por isso continua avançando em seu desenvolvimento. Já o Plano Diretor é uma proposta conceitual - solicitada pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH) e pelo Instituto Histórico Artístico Nacional (IPHAN) – com o objetivo primordial de reordenamento das infraestruturas já existentes no monumento natural. Vale destacar que os órgãos licenciadores poderão sugerir ajustes ou vetar sugestões contidas na proposta".
Sobre as perfurações e transformações futuras, a empresa reforça necessidade de "um pequeno nivelamento (cerca de 0,000124% do volume total do maciço) da rocha em área já antropizada para assentamento de passarelas de acesso ao público, prioritariamente ao público PCDs. Não haverá aumento de área construída no projeto da tirolesa, que vem sendo desenvolvido com todas as devidas aprovações por parte dos órgãos licenciadores. Não haverá aumento de lojas e bates, apenas modernização".
O município esclarece que a Geo-Rio aguarda a empresa cumprir exigências para emitir ou não a licença das obras relativas ao desmonte de rochas
Projeto de lei
Presente na manifestação, o deputado Carlos Minc confirmou um projeto de lei a ser divulgado na terça-feira.
Como propostas, ele destacou duas: tombar toda a área florestal e silvestre do Pão de Açúcar, além de congelar a densidade volumétrica construída, ou seja, o Parque Bondinho não poderá ampliar o espaço, apenas substituir as construções.
Minc também reforçou preocupação da Unesco com as transformações no parque ambiental, explicando que elas podem, eventualmente, resultar na retirada do título de Patrimônio Mundial