Sexta, 22 Agosto 2025 22:18
NOVOS TEMPOS

Encontro Nacional do Itaú: tecnologia tem que servir ao trabalhador

Dirigentes sindicais criticam uso da Inteligência Artificial pelos bancos para extinguir agências e demitir bancários e adoecimento dos funcionários
A diretora do Sindicato do Rio e coordenadora da COE do Itaú no Encontro Nacional: "Tecnologia tem de ser para melhorar o serviço bancário e a vida do trabalhador, não para substituir o emprego das pessoas" A diretora do Sindicato do Rio e coordenadora da COE do Itaú no Encontro Nacional: "Tecnologia tem de ser para melhorar o serviço bancário e a vida do trabalhador, não para substituir o emprego das pessoas" Foto: Contraf-CUT

 

Carlos Vasconcellos
Imprensa SeebRio
Com informações da Contraf-CUT

O Encontro Nacional dos Funcionários do Banco Itaú-Unibanco foi encerrado na noite desta sexta-feira, 21 de agosto, em São Paulo. O evento reuniu 86 dirigentes sindicais e representantes de base de diversas regiões do país para debater temas estratégicos como o cenário político e econômico, os impactos da Inteligência Artificial (IA) na atividade bancária e as condições de saúde e trabalho dos bancários.

Organização e unidade

A abertura do encontro foi conduzida pela Coordenação da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Itaú-Unibanco e por integrantes do Comando Nacional dos Bancários, que destacaram a importância da unidade e da organização da categoria frente aos desafios atuais.

Na análise de conjuntura, a presidenta da Federação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro do Rio de Janeiro (Federa-RJ), Adriana Nalesso, destacou que a tecnologia deve estar a serviço da sociedade e dos trabalhadores — e não ser apenas uma ferramenta para maximizar lucros. “A tecnologia tem que servir à classe trabalhadora, garantindo mais qualidade de vida. Para isso, vamos fazer o que sabemos: lutar, resistir e avançar”, afirmou Adriana. Ela também relacionou o atual cenário internacional à disputa pelas riquezas da América Latina, afirmando que a reforma trabalhista, os ataques aos direitos e a tentativa de enfraquecer a Convenção Coletiva de Trabalho estão diretamente ligados aos interesses do capital financeiro e das grandes corporações.

Os dirigentes alertaram que os bancos tentam fragmentar a CCT para competir com as fintechs, o que exige maior mobilização para preservar as conquistas históricas da categoria.

IA e impactos no emprego

A economista Cátia Uehara, técnica da subseção do Dieese junto ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, apresentou o painel “Inteligência Artificial e o Banco Itaú-Unibanco – Impactos na Atividade Bancária”. Ela expôs dados que mostram o avanço das transações digitais e os investimentos crescentes em tecnologia, que vêm mudando o perfil do emprego bancário, com aumento de ocupações em TI e queda nos postos de trabalho tradicionais.

O volume de transações bancárias no Brasil superou 200 bilhões em 2024, rescimento de 8% em relação a 2023, puxado pelo mobile banking. Entre 2018 e 2023, o orçamento global dos bancos com tecnologia cresceu 35%, enquanto no Brasil o aumento foi de 97%.

No Itaú, os profissionais de TI passaram de 2,7% do total em 2013 para 20% em 2024 — hoje são 17,3 mil trabalhadores nessa área. O banco criou, em abril de 2025, o Instituto de Ciência e Tecnologia Itaú, com 80 pesquisadores em IA generativa e computação quântica, em parceria com instituições como MIT, Stanford e USP.

Fechamento de agências

Ao mesmo tempo, o Itaú segue reduzindo sua estrutura física. Entre 2014 e junho de 2025, foram fechadas 2.031 agências — uma média de 3,5 por semana. Só em 2024, o Itaú encerrou 223 unidades; o Bradesco, 342; e o Santander, 561. Desde 2018, o sistema financeiro nacional perdeu 4.853 agências, queda de 23,3%.

O número de empregados no Itaú caiu de 104 mil (em 2009) para 85,7 mil (em 2025), com a eliminação de 18,2 mil postos. Somente entre 2023 e 2024, foram 1.600 cortes no Brasil, parcialmente compensados por 1.100 novas vagas em tecnologia. Enquanto isso, os lucros do setor financeiro continuam crescendo: no primeiro semestre de 2025, os três maiores bancos privados registraram R$ 41,6 bilhões, uma alta média de 19,8%. O Itaú foi destaque, com lucro de R$ 22,1 bilhões, crescimento de 33,7% sobre o ano anterior.

Mecanismo adoecedor

À tarde, o evento contou com o Painel Saúde e Condições de Trabalho, Mauro Salles, secretário de Saúde da Contraf-CUT, apresentou dados preocupantes sobre as práticas de gestão do Itaú, que caracterizam um verdadeiro “mecanismo adoecedor”, marcado por vigilância excessiva, cobrança abusiva e impacto direto na saúde física e mental dos bancários. Entre os principais problemas citados estão: metas inatingíveis e avaliações injustas; estímulo ao individualismo e à competitividade; reestruturações constantes; jornadas exaustivas e assédio moral e monitoramento digital excessivo, inclusive fora do expediente

O Programa GERA foi citado como exemplo de ferramenta de pressão: trata-se de um sistema de monitoramento e ranqueamento de desempenho, com cobranças em tempo real via WhatsApp e plataformas internas, reuniões diárias com exposição de resultados e cobrança constante por produtividade. Segundo Mauro, esses mecanismos provocam ansiedade, estresse e burnout, sensação de vigilância permanente, até no home office , insegurança no emprego e rivalidade entre colegas.

Foram sugeridas no encontro ações, como: dnúncias formais ao Ministério Público do Trabalho e à Auditoria Fiscal; reivindicação de auditoria externa sobre os dados captados pelos sistemas do banco; negociação para readequar o Programa GERA; limites ao uso de ferramentas de monitoramento e campanhas de mobilização com o lema “Não somos robôs. Conectar não é se submeter.”

Reivindicações específicas e transição justa

Ao final do encontro, os participantes debateram e encaminharam a pauta de reivindicações específicas, que deverá orientar as próximas mesas de negociação com o Itaú.

Para Maria Izabel Cavalcanti Menezes, coordenadora da COE Itaú-Unibanco e diretora do Sindicato dos Bancários do Rio, a reflexão sobre o papel da tecnologia foi central. “É preciso que a tecnologia venha para melhorar o serviço e não para substituir o trabalhador. Queremos uma transição justa para o modelo de IA, que garanta o emprego, respeite o meio ambiente e assegure trabalho decente. Os ganhos de produtividade devem ser compartilhados com os trabalhadores”, afirmou. Ela defendeu também o fortalecimento da luta nacional contra os ataques do banco:

“É fundamental combater o fechamento de agências, as demissões, as metas abusivas, a sobrecarga de trabalho e o adoecimento da categoria”, concluiu.

 

Mídia