Sexta, 04 Junho 2021 17:43

TRT mantém reintegração no Bradesco com base no compromisso de não demitir na pandemia

 

Olyntho Contente

Imprensa SeebRio

Por uma destas coincidências históricas, no dia 13 de maio último, data em que se comemora a abolição da escravatura no Brasil, a Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT/RJ) decidiu rejeitar o agravo interno movido pelo Bradesco, para que anulasse a tutela antecipada da 25ª Vara do Trabalho que reintegrou o bancário Alberto Ricardo de Souza Sampaio. O que levou a primeira instância a determinar a volta ao trabalho foi o reconhecimento do compromisso assumido publicamente pelos bancos de não demitir durante a pandemia do novo coronavírus, desrespeitado pela demissão em outubro último. Ricardo Sampaio tem 34 anos de banco. A ação de reintegração foi movida pelo advogado do Jurídico do Sindicato, Marcelo Coutinho.

O Bradesco alegou que ‘em nenhum momento’ o banco se comprometeu a não demitir, mas que ‘apenas’ participou, com mais de 4 mil empresas, inclusive outros bancos, do Movimento #NãoDemita, que se comprometeu a não realizar dispensas durante a pandemia. Negou serem provas do compromisso o documento de adesão ao #NãoDemita, ou a ampla cobertura da mídia sobre o assunto, com inúmeras notícias sobre a adesão, bem como reportagens com declarações de diretores do Bradesco e de outros bancos anunciando que não demitiriam durante a pandemia.

O Bradesco também negou que fosse prova do compromisso a inclusão do anúncio de não demitir durante a pandemia em seu relatório Capital Humano 2º Trimestre, em sua página 66. Em seu voto, aprovado por maioria pelo TRT, o relator do caso, o desembargador Jorge Orlando Sereno Ramos, demonstrou estarem equivocadas, uma a uma, todas as alegações. Começou por demonstrar a contradição do mandado de segurança em que o banco alega, primeiramente, não considerar como compromisso a adesão ao Movimento #NãoDemita para, mais à frente, afirmar ter a adesão prazo de dois meses, abril e maio de 2020, tendo o bancário sido demitido em 21 de outubro de 2020.

O Bradesco chegou a afirmar no mandado que, mesmo tendo aderido ao movimento, não se via impedido de exercer o seu ‘direito de rescindir o contrato’ de seus empregados. Negou também que a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) tivesse assumido tal compromisso com o Comando Nacional dos Bancários, contradizendo os fatos.

O voto do relator

Em seu voto, o relator Jorge Orlando Sereno Ramos ressaltou ter verificado nos autos do processo a existência de provas apresentadas pelo bancário sobre as quais o magistrado da primeira instância se debruçou para então tomar a decisão de considerar a existência do direito à estabilidade provisória, enquanto perdurar a pandemia, ordenando a reintegração. O desembargador citou, entre elas, as matérias publicadas em larga escala pela imprensa nas quais o compromisso foi exaltado, inclusive, em declarações de diretores do Bradesco e de outros bancos como elemento importante de preservação dos empregos enquanto durar a pandemia. Cita outras provas ‘como o documento interno denominado relatório de Capital Humano, onde consta que "Também aderimos ao movimento #NãoDemita, um pacto firmado entre empresas para preservar empregos e evitar a demissão de milhares de pessoas. (Id 2d2044b dos autos originais)”.

O desembargador foi taxativo na recusa do pedido de rejeição da decisão de primeira instância, lembrando do momento dramático vivido por todo o mundo, sobretudo no Brasil, o caráter social das empresas e a excelente saúde econômica das instituições financeiras, ao contrário dos demais setores da sociedade: “As notícias divulgadas na imprensa e os números de balanços contábeis do último semestre demonstram não só o aumento pela demanda de serviços financeiros, mas, também, que as instituições não sofreram grandes impactos em seus lucros com a crise causada pela pandemia do novo coronavírus, sendo de se destacar que o descumprimento do compromisso assumido seja com seus empregados, seja para com toda a sociedade, importa em contrariedade ao que se assumiu voluntariamente e se empenhou em divulgar entre seus colaboradores e na imprensa de maneira geral, caracterizando o que se denomina venire contra factum proprium, situação que afronta o princípio da boa-fé objetiva, insculpido no artigo 422 do Código Civil, assim como atenta contra os princípios da dignidade da pessoa humana e da função social da empresa, previstos na Constituição Federal de 1988 (inciso III do art. 1º e art. 170)”.

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