EXPEDIENTE DO SITE
Diagramação: Marco Scalzo
Diretora de Imprensa: Vera Luiza Xavier
Olyntho Contente
Imprensa SeebRio
Por uma destas coincidências históricas, no dia 13 de maio último, data em que se comemora a abolição da escravatura no Brasil, a Seção Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro (TRT/RJ) decidiu rejeitar o agravo interno movido pelo Bradesco, para que anulasse a tutela antecipada da 25ª Vara do Trabalho que reintegrou o bancário Alberto Ricardo de Souza Sampaio. O que levou a primeira instância a determinar a volta ao trabalho foi o reconhecimento do compromisso assumido publicamente pelos bancos de não demitir durante a pandemia do novo coronavírus, desrespeitado pela demissão em outubro último. Ricardo Sampaio tem 34 anos de banco. A ação de reintegração foi movida pelo advogado do Jurídico do Sindicato, Marcelo Coutinho.
O Bradesco alegou que ‘em nenhum momento’ o banco se comprometeu a não demitir, mas que ‘apenas’ participou, com mais de 4 mil empresas, inclusive outros bancos, do Movimento #NãoDemita, que se comprometeu a não realizar dispensas durante a pandemia. Negou serem provas do compromisso o documento de adesão ao #NãoDemita, ou a ampla cobertura da mídia sobre o assunto, com inúmeras notícias sobre a adesão, bem como reportagens com declarações de diretores do Bradesco e de outros bancos anunciando que não demitiriam durante a pandemia.
O Bradesco também negou que fosse prova do compromisso a inclusão do anúncio de não demitir durante a pandemia em seu relatório Capital Humano 2º Trimestre, em sua página 66. Em seu voto, aprovado por maioria pelo TRT, o relator do caso, o desembargador Jorge Orlando Sereno Ramos, demonstrou estarem equivocadas, uma a uma, todas as alegações. Começou por demonstrar a contradição do mandado de segurança em que o banco alega, primeiramente, não considerar como compromisso a adesão ao Movimento #NãoDemita para, mais à frente, afirmar ter a adesão prazo de dois meses, abril e maio de 2020, tendo o bancário sido demitido em 21 de outubro de 2020.
O Bradesco chegou a afirmar no mandado que, mesmo tendo aderido ao movimento, não se via impedido de exercer o seu ‘direito de rescindir o contrato’ de seus empregados. Negou também que a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) tivesse assumido tal compromisso com o Comando Nacional dos Bancários, contradizendo os fatos.
O voto do relator
Em seu voto, o relator Jorge Orlando Sereno Ramos ressaltou ter verificado nos autos do processo a existência de provas apresentadas pelo bancário sobre as quais o magistrado da primeira instância se debruçou para então tomar a decisão de considerar a existência do direito à estabilidade provisória, enquanto perdurar a pandemia, ordenando a reintegração. O desembargador citou, entre elas, as matérias publicadas em larga escala pela imprensa nas quais o compromisso foi exaltado, inclusive, em declarações de diretores do Bradesco e de outros bancos como elemento importante de preservação dos empregos enquanto durar a pandemia. Cita outras provas ‘como o documento interno denominado relatório de Capital Humano, onde consta que "Também aderimos ao movimento #NãoDemita, um pacto firmado entre empresas para preservar empregos e evitar a demissão de milhares de pessoas. (Id 2d2044b dos autos originais)”.
O desembargador foi taxativo na recusa do pedido de rejeição da decisão de primeira instância, lembrando do momento dramático vivido por todo o mundo, sobretudo no Brasil, o caráter social das empresas e a excelente saúde econômica das instituições financeiras, ao contrário dos demais setores da sociedade: “As notícias divulgadas na imprensa e os números de balanços contábeis do último semestre demonstram não só o aumento pela demanda de serviços financeiros, mas, também, que as instituições não sofreram grandes impactos em seus lucros com a crise causada pela pandemia do novo coronavírus, sendo de se destacar que o descumprimento do compromisso assumido seja com seus empregados, seja para com toda a sociedade, importa em contrariedade ao que se assumiu voluntariamente e se empenhou em divulgar entre seus colaboradores e na imprensa de maneira geral, caracterizando o que se denomina venire contra factum proprium, situação que afronta o princípio da boa-fé objetiva, insculpido no artigo 422 do Código Civil, assim como atenta contra os princípios da dignidade da pessoa humana e da função social da empresa, previstos na Constituição Federal de 1988 (inciso III do art. 1º e art. 170)”.