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Olyntho Contente*
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É falso o conceito de empresas, bancos e de governos, parlamentares e economistas conservadores de que o investimento estatal, entre eles, o de bancos públicos, é prejudicial ao mercado. A avaliação foi feita pelos economistas Juliane Furno e Gustavo Cavarzan, nesta quarta-feira (5/5), na terceira mesa de debates do 34º Congresso Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil, sobre o papel do Estado no crescimento do país: “Desenvolvimento e bancos públicos é uma coisa só, um não vive sem o outro”.
“Essa ideia é uma demagogia completamente diferente do que mostra a história. Foi o Estado quem pariu o mercado. Não só isso, a existência de um Estado forte é que cria um bom ambiente para iniciativas de mercado”, afirmou Juliane Furno, cientista social, economista e doutora em Desenvolvimento Econômico pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), também assessora da diretoria do BNDES. Lembrou que o período de transição que levou à saída do feudalismo, foi com a construção e fortalecimento do Estado e do sistema de Justiça, dando as bases para a existência do capitalismo. “É o Estado que vai garantir, por meio da justiça e da lei, a propriedade privada. O Estado cria, através também do sistema jurídico, o livre mercado”, frisou.
Juliane Furno explicou que mesmo para ter livre mercado é preciso ter Estado, por exemplo, para impedir a formação de cartel, monopólio e coordenação de preços. “Porque a realidade é que a tendência do mercado é esmagar os pequenos e, cada vez mais, concentrá-los em grandes grupos.”
Reduzir desigualdades – Os economistas destacaram o papel fundamental dos bancos públicos em setores-chave da economia, como habitação, agricultura e indústria. Furno e Cavarzan ressaltaram que, sem o apoio dessas instituições, tais setores teriam menos acesso a recursos para investimentos, o que aprofundaria ainda mais as desigualdades regionais do país. “O Estado não concorre com o setor privado, ele complementa. Investe em setores essenciais que o setor privado não teria condições de desenvolver sozinho”, acrescentou Juliane.
Inflação – Cavarzan – que também atua na subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) na Contraf-CUT – explicou que entre as críticas frequentemente apresentadas pelo viés do pensamento econômico conservador está a de que a participação dos bancos públicos atrapalha o cumprimento da meta de inflação, a ‘eficiência’ na alocação de recursos e harmonia entre as políticas monetária e fiscal. E que somente o livre mercado é capaz de garantir a alocação eficiente de recursos.
“Mas não é o que ocorre na prática”, afirmou. “Ao contrário dos bancos públicos, os bancos privados tendem a concentrar suas operações de crédito nas regiões mais dinâmicas, porque priorizam retornos rápidos e menos arriscados”, disse o economista.
Privados miram somente o lucro - Em 2022, a participação dos bancos públicos no saldo de crédito imobiliário e no saldo de crédito rural total foi de 74,2% e 75,8%, respectivamente. “A pouca participação dos bancos privados não se dá porque existe uma tradição da atuação dos bancos públicos, mas sim, porque são áreas que necessitam de muitos recursos e de extenso período para concretização, especialmente no caso habitacional, ou que estão sujeitas a mudanças climáticas e que podem afetar a safra e gerar oscilações de preços, especificamente no caso da agricultura. Todos esses são elementos que fazem com que os bancos privados evitem financiar esses setores e, por isso, possuem baixa participação”, disse Cavarzan.
Estado não concorre com o mercado - Juliane reforçou que, principalmente no Brasil, foi o Estado que construiu o capitalismo, a classe dominante e o setor privado. “Foi Getúlio Vargas, a partir de 1930, quem unificou o Estado nacional, porque, até então, o presidente tinha menos poder que os governadores, que eram chamados, inclusive, de presidentes dos estados. É Getúlio quem organizou o Brasil para desenvolver o capitalismo, a partir da criação de códigos, leis, normas, autarquias, empresas. O Estado, estabelecido por ele, jamais concorreu com o mercado.” A palestrante ainda lembrou que o setor privado é guiado pela maximização do lucro no menor espaço de tempo possível. “O que é normal”, acrescentou.
Antes de finalizar, Juliane fez uma provocação aos participantes do congresso para repensar o papel do Estado e sua relação com o desenvolvimento nacional. “Ou fazemos isso agora, em um novo governo de Lula, ou corremos o risco de perder mais instrumentos essenciais para o desenvolvimento nacional, como os bancos públicos”, alertou.
Bancos públicos evitam crises - Sobre o controle da concorrência, dados apresentados por Carvazan mostraram que, a taxa média cobrada pelo conjunto dos bancos públicos e comparada à taxa média extraída para o conjunto dos três bancos privados analisados segue sendo bem menor do que a dos privados, em análises feitas entre 2012 e 2022. No último ano da série, enquanto as taxas médias de juros para cartão de crédito pessoal (pessoa física) cobrada pelos privados foi de 94,55%, a média cobrada pelos bancos públicos foi de 60,11%.
Já, em relação à atuação anticíclica, lembrou do que ocorreu durante a crise financeira mundial quando, entre 2008 e 2009, as operações de crédito de controle privado caíram de 32% para 21,6%, enquanto que as operações de controle público subiram de 36,1% para 39,2%.
Desenvolvimento regional – Em relação ao desenvolvimento regional, dados apresentados na mesa de debates mostram que, em 2022, os bancos públicos foram responsáveis por 90,4% das operações de crédito na região Norte, 87,8% nas da região Nordeste e 85,7% da região Centro-Oeste. Nas regiões com maior concentração econômica – Sul e Sudeste – a participação dos bancos públicos nas operações de crédito foi 77,7% e 26,2% respectivamente. Nas cidades do interior, os bancos públicos repetem a mesma importância, com 66,5% das concessões de crédito registradas em 2022.
Bancos públicos e política econômica – Os bancos públicos, portanto, são ferramentas importantes para atuar em áreas de pouco interesse para o setor privado. “E, dessa forma, atenuar as desigualdades regionais, historicamente existentes”, reforçou Gustavo Cavarzan. “Enquanto que os bancos privados, acabam contribuindo para a reprodução das desigualdades, quando priorizam regiões geográficas, faixas de renda, setores e atividades que apresentam os maiores e mais rápidos resultados”, completou.
Nesse sentido, concluíram os economistas, a atuação dos bancos públicos deve estar atrelada à política econômica: no combate ao desemprego e pela geração de renda para a população, quando impulsiona o setor habitacional; na consolidação de planos de urbanização democráticos e inclusivos, quando financia infraestrutura de saneamento e transporte; na geração de empregos qualificados e bem remunerados, quando no financiamento do setor industrial, sobretudo com o objetivo de promover o desenvolvimento de setores intensivos em tecnologia e inovação e que reduzam a dependência econômica do Brasil em relação aos outros países; no combate à fome, quando impulsiona o setor agrícola, mas sem deixar de considerar a redução da desigualdade fundiária e a questão ambiental.
*Com informações da Secretaria de Comunicação da Contraf-CUT.