Sábado, 28 Outubro 2023 14:17
BB BLACK POWER

Pesquisadora e terapeuta dizem que racismo institucional adoece e mata negros e negras

Alessandra Nzinga, doutoranda em Ciências Sociais pela UFRJ, deu um depoimento pessoal das repercussões do racismo institucional sobre a saúde de negros e negras Alessandra Nzinga, doutoranda em Ciências Sociais pela UFRJ, deu um depoimento pessoal das repercussões do racismo institucional sobre a saúde de negros e negras Foito\; Nando Neves

Carlos Vasconcellos

Imprensa SeebRio

 

A pesquisadora e cientista social, doutoranda em Ciências Sociais pela UFRJ, Alessandra Nzinga, falou de “Saúde da população negra”, na manhã deste sábado (28), no I Encontro Nacional do BB Black Power, realizado no Sindicato dos Bancários do Rio.

A especialista disse que o racismo institucional adoece e mata negros e negras. Ela relatou sua luta desde a infância pobre, em Japeri, na Baixada Fluminense, quando aprendeu que, por ser mulher negra, precisava se qualificar mais e fazer concurso para ser servidora pública, a fim de conseguir ascensão profissional e social, o que a teria tornado “viciada” em estudar. Lembrou ainda que neste momento está defendendo uma tese de doutorado ao mesmo tempo que faz uma pós-graduação.

“"Precisamos entender o quanto o racismo massacra a gente", desabafou. 

 

Refletir sobre saúde e trabalho

 

Alessandra disse que, mais recentemente, passou a refletir porque ela estuda tanto, dizendo ser “viciada” em estudo.

“Descobri que é porque as portas eram fechadas porque diziam que eu ‘não era qualificada’. O racismo fez isso comigo e fiquei viciada em estudar. Passei a estudar compulsivamente. Sou fotógrafa, depiladora, confeiteira, costureira, manicure, bordadeira, salgadeira, tudo com certificado, uma infinidade de coisas porque o racismo disse que eu não era qualificada e nem boa o suficiente para o mercado. Agora acabei de ter uma porta fechada porque ‘eu era muito qualificada.’ Aí fiquei mal", desabafou. 

Violência institucional

A palestrante disse que é preciso perceber como as violências institucionais se apresentam. "Sou uma mulher preta, qualificada e bonita, mas eu continuo sendo um problema, porque uma mulher negra muito qualificada e que conhece seus direitos incomoda”, acrescentou.

Disse que é importante em algum momento saber a hora de “pisar no freio” e que a mulher negra acaba interiorizando a logica racista institucional.

“Nós mulheres, lideramos os maiores rankings de tragédias. Dados do último censo do IBGE no Rio de Janeiro revelam que o número de mulheres de meia idade aumentou. É preciso saber como a sociedade e o SUS estão se preparando para cuidar dessas mulheres”, questionou, apresentando dados que  mostram que 62% das mulheres assassinadas no município do Rio de Janeiro são negras. Ela ressaltou também que nestes números estão feminicídios subnotificados, ainda tratados como homicídios.

“Tivemos 34.256 mulheres vitimizadas na cidade do Rio de Janeiro, a maioria na própria casa da vítima”, relatou. .

“Dizem que temos que deixar o problema na porta de casa, mas como fazer isso se a gente chega no trabalho e a violência institucional contra mulheres e contra mulheres e homens negros está lá e a gente as vezes nem reconhece isso. É a cobrança, o medo de perder o emprego e o servidor com receio de ser transferido para um local de trabalho mais distante. Se não pararmos, não cuidarmos da nossa saúde não vamos ter condições de brincar com a criança, de passar a mão na cabeça do cachorro. Temos que viver.”, disse.

“Temos que pensar o que a gente precisa fazer com o que essas pessoas estão fazendo com a gente”, questionou, sendo muito aplaudida pelos participantes do evento.

 

Maltrato histórico

 

Sônia Nascimento, terapeuta holística, conselheira municipal de saúde, líder comunitária e membro do Fórum Estadual de Mulheres Negras, que também fez parte da mesa, alertou sobre os problemas de saúde de trabalhadores e trabalhadoras negros.

“Quando a gente fala de saúde da população negra eles diagnosticam que estamos com Síndrome de Burnout [doença causada pelo esgotamento profissional], mas a gente chama isso de “banzo” [sentimento de melancolia dos negros escravizados no Brasil com saudade da terra natal e aversão à privação da liberdade], quando nossos ancestrais não aguentavam mais de tanto maltrato. Precisamos falar do quanto o racismo nos adoece e ainda faz com que a gente se culpe”, criticou.

 

 

 

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