Sábado, 03 Agosto 2019 16:13
PAINEL SOBRE CONJUNTURA

Autocrítica, unidade e novas estratégias de luta são apontadas como saída para a crise

Fernando Haddad aponta caminhos na educação como saída para a crise e defende a unidade das forças políticas do campo progressista e popular Fernando Haddad aponta caminhos na educação como saída para a crise e defende a unidade das forças políticas do campo progressista e popular

Na abertura do painel sobre a análise de conjuntura da 21ª Conferência Nacional dos Bancários, na manhã deste sábado, dia 3 de agosto, Alejandro Guiller, senador chileno, criticou o modelo da democracia chilena. Disse que a democracia em seu país, como no Brasil, está em crise.  

“Decisões são tomadas pelo governo, pelos poderosos grupos econômicos sem ouvir o sistema de representação, os movimentos sociais”, disse. .

Destacou as mudanças impostas pelo capitalismo que precarizam ainda mais as condições do trabalho e a ideia que tentam passar para o trabalhador de que ele não é um empregado, mas sim um “empreendedor”, um “parceiro” do patrão, sem direito nenhum, sem serviços de seguridade social e sem a organização sindical, situação também similar ao que tem ocorrido cada vez mais no Brasil. Criticou ainda a fragmentação, terceirização e quarteirização promovidas nas empresas de seu país.

“Flexibilização das leis trabalhistas significa precarizar ainda mais o trabalho e o desemprego é mais uma forma de desorganizar coletivamente o trabalhador”, acrescentou. Criticou o discurso neoliberal que faz apologia da negociação direta do empregado com o patrão, criando uma mesa paralela para limitar a participação da presença da organização sindical na vida do trabalhador.

Defendeu uma estrutura sindical mais transparente e interativa para com a sociedade.

“Os sindicatos não podem se limitar a seus vínculos com partidos políticos e a defender suas respectivas categorias, mas o discurso precisa ser voltado também para o trabalhador terceirizado, que está num trabalho ainda mais precário, que não tem quem o defenda. É preciso garantir trabalho decente para todos. É necessário defender todos os trabalhadores, os direitos fundamentais, as garantias constitucionais e promover uma abertura para maior participação da população nas entidades sindicais”, avaliou.

Destacou também a importância da criação de redes sociais de comunicação alternativas para contrapor ao discurso hegemônico da mídia e ajudar a formar um discurso comum na opinião pública. Destacou ainda a importância da globalização da luta e organização coletiva dos trabalhadores.

“Precisamos fazer alianças que multipliquem os vínculos entre os trabalhadores, para enfrentar a transnacionalização das grandes empresas, que violam aos direitos dos trabalhadores, agridem o meio ambiente e discriminam as mulheres. Os sindicatos também têm que ser globalizados”.

Tática militar de guerra

O ex-candidato do PSOL à presidência da República e líder do  Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Guilherme Boulos disse que, apesar de similaridades com a situação política no Chile e na América Latina, o caso brasileiro tem um diferencial: o governo Bolsonaro usa táticas militares de guerra para fortalecer seu “núcleo duro” de apoio criado para desarmar a reação, promover o caos e quebrar as forças de resistência para impor seus interesses políticos e econômicos.

“Está sendo aplicada no Brasil uma tática militar de saturação detonando a reação e normalizando o absurdo. É uma tática que vem da cúpula militar, do que há de pior nas forças armadas brasileiras”, disse, lembrando que no passado o Brasil tinha militares de esquerda, como Luis Carlos Prestes e, mesmo no campo conservador, oficiais nacionalistas e legalistas.

Boulos falou ainda da interferência dos EUA nos destinos políticos e econômicos do Brasil para destruir do projeto nacional.  

“O governo desmonta as instituições públicas e o estado social, como no governo Fernando Henrique Cardoso, em que setores estratégicos da economia foram entregues, numa linha privatista que quer promover um sistema de privilégios, voltado somente para quem pode comprar”, destacou.

Mudança de estratégia

O líder do PSOL disse ainda que é preciso criar novas estratégias de reação ao projeto ultraliberal da extrema direita.

 “Precisamos refletir para entender porque e como essa turma conseguiu ganhar uma eleição presidencial. Temos que ter cuidado com reações que rotulam todo o eleitor deste governo como fascista. Nem todo o eleitor do Bolsonaro representa esse elemento pior, destruidor. A maioria, deserdada pela crise econômica, foi induzida a votar neles por outras razões”, acrescentou.

Criticou a operação Lava-Jato, que também teve influência decisiva nas eleições de 2018. “Há uma legião de desencantados com a política e a operação judicial foi utilizada sob medida para eleger este governo. Bolsonaro é filhote da operação Lava-Jato”, disse.

Para Boulos, o apoio internacional dos EUA foi decisivo para as eleições que resultaram na atual conjuntura política no Brasil, através da utilização da tecnologia em redes sociais, como no Brexit no Reino Unido.

“Eles estudam quais são as preferências das pessoas, seus medos e preocupações, para então enviar, sob medida, as mensagens para  a população através das redes sociais. Há tecnologia que acompanha cada curtida, cada busca no facebook, são dados que ficam no big data”, explicou,  Defendeu a liberdade do ex-presidente Lula, dizendo que os vazamentos dos diálogos do ex-juiz e ministro da Justiça Sérgio Moro com membros do Ministério Público Federal confirmam a trama política para impedir a eleição do candidato petista, líder em todas as pesquisas de opinião.

 É necessária a autocrítica

 Boulos apontou como saída para a crise, a participação popular e a democratização da política. Lembrou que as periferias estão dispostas a ouvir, estão decepcionadas com o governo.

“Precisamos retomar as ruas, dialogar com o povo, desenvolver um discurso para os que não pensam como a gente, voltar a trazer esperança ao povo brasileiro. Não podemos ser portadores do passado, mas do futuro. Isso não significa deixar de reconhecer conquistas, como os programas sociais, o acesso à universidade e melhorais na vida do povo. Mas precisamos ter humildade para reconhecer os erros do que não foi feito, como a reforma política, a democratização da comunicação e o enfrentamento do oligopólio financeiro que manda nesse país”, concluiu.

 Educação aponta saídas

Professor universitário da USP, Fernando Haddad, ex-candidato do PT à presidência da República, defendeu maior intensidade de novas produções acadêmicas para enfrentar o retrocesso político e econômico.  

“Temos que voltar a nos reunir com mais frequência e produzir conhecimento novo. Temos que formar novos celsos furtados, chicos de oliveira, conceições Tavares. É preciso estimular as pessoas a se debruçarem para pensar sobre o Brasil. As universidades estão cada vez mais distanciadas da necessidade de pensar o futuro dos brasileiros”. O petista criticou também a postura do atual governo de subserviência aos interesses dos EUA.

“Bolsonaro não tem a menor liturgia de se prostrar aos interesses do império norte-americano, afastando importantes parceiros recém-conquistados pelo Brasil e que hoje estão desconfiados de nosso posicionamento”, disse, referindo-se a política internacional que o país construiu nos últimos anos de maior aproximação com a China, Rússia e América Latina e que está sendo desfeita. Citou o acordo que permite ao cidadão americano entrar no Brasil sem visto sem a contrapartida para os brasileiros que visitam os EUA como exemplo desta submissão do país à Casa Branca.

A crise e os militares

Haddad também criticou a atual posição dos militares na conjuntura do país. “Onde esta o velho nacionalismo dos militares? É verdade que eles nunca assimilaram o conceito de soberania popular, a participação democrática do povo, mas atÉ os anos 70 os militares tinham um projeto para o Brasil, uma preocupação com o desenvolvimento nacional, não se via nenhum entreguista. Hoje vemos uma posição patética que envergonharia qualquer membro das forças armadas de uma nação desenvolvida”, destacou. Acusou de sabotagem a postura do Congresso Nacional que resultou no impeachment da presidente Dilma Rousseff.

“Desde 2013 que vivemos um retrocesso no trabalho, no crédito, em todos os pilares do projeto de desenvolvimento. Se não produzirmos novos conhecimentos, vamos ver o bonde da historia dar marcha ré. Mas se estivemos juntos na unidade progressista poderemos reverter esta situação. O Brasil não aguentaria oito anos de governo Bolsonaro”, declarou, defendendo a unidade das forças progressistas e populares. Criticou ainda os políticos de centro. “Eles cometeram um suicídio político na eleição de 2018 se aliando ao que há de pior no quadro político da história do país. Agora muitos deles estão voltando envergonhados por ter ajudado a criar um bicho que eles não são capazes de domesticar”, acrescentou. Falou também da luta pela redemocratização.

“O centro quer uma democracia de gabinete, não participativa, em que o povo não é ouvido.  Quando e onde houve avanço social sem participação popular?”, questionou. , “Há uma juventude ávida por participação. Mais de um milhão de jovens, estudantes, professores, profissionais da educação foram às ruas protestar”, destacou.

Participação dos bancários

A presidenta do Sindicato do Rio, Adriana Nalesso destacou a importância de os trabalhadores estarem organizados para levar a população a uma reflexão sobre a conjuntura.

“É hora de olharmos nos olhos da população, debater política com a nossa base, a categoria bancaria. Muitos dizem que sindicato não pode se meter em política, mas temos, sim, que debater política. Vivemos momentos difiíceis desde o impeachment da presidenta Dilma. O retrocesso andou a passos largos: reforma previdência e trabalhista, ampliação da terceirização e da precarização do trabalho, desemprego”, disse.

Nalesso defendeu um novo projeto para o Brasil.

“Defendemos um Brasil soberano, que respeite os direitos dos trabalhadores, dos negros e negras, das LGBTs, das mulheres. Precisamos debater nas ruas, qual país queremos, junto à categoria, nas igrejas, em todos os espaços. Nossa luta é por democracia, por direitos, contra a privatização e a reforma da Previdência. Não vamos retomar a geração do emprego com a especulação e a agiotagem oficial, com bancos adoecendo trabalhadores bancários Temos certeza  de estamos do lado certo. Como diz Lula, o povo não é o problema, mas a solução para a crise”, conclui.  

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