Segunda, 25 Março 2024 21:10
DITADURA NUNCA MAIS

Fernanda Carisio: a bancária do BB e dirigente sindical que foi presa e torturada pelos militares

Fernanda Carisio: “A democracia e a liberdade de organização e manifestação são essenciais para que tais situações não se repitam mais” Fernanda Carisio: “A democracia e a liberdade de organização e manifestação são essenciais para que tais situações não se repitam mais”

Nesta última matéria da série especial “Ditadura nunca mais”, marcando os 60 anos do golpe militar de 1964 que derrubou o governo democrático de João Goluart e implantou 21 anos de regime militar autoritário, apresentamos um depoimento vivo de quem viveu aquele período dramático da vida brasileira: Fernanda Carisio, bancária do Banco do Brasil, que foi presidenta do Sindicato dos Bancários do Rio e da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), o embrião da Contraf-CUT, a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro.

Uma história de luta

Fernanda começou a militar na política ao entrar para a universidade em 1972. Entrou para a faculdade de jornalismo na PUC, onde iniciou sua militância no então Partido Comunista Brasileiro (PCB), transferindo-se depois para a UFF (Universidade Federal Fluminense).
Continuou militando no movimento estudantil e ingressou na Fração Bolchevique da Política Operária, que posteriormente veio a realizar seu primeiro congresso e a se denominar Movimento pela Emancipação do Proletariado (MEP). Ao passar no concurso para o Banco do Brasil se aproximou do movimento sindical bancário. Como jornalista, trabalhou durante alguns anos na Tribuna da Imprensa, o último jornal a contar com a presença de censores diretamente na redação, assediando os jornalistas e censurando abertamente o jornal

Prisão e tortura

Em julho de 1977, Carisio e vários militantes do MEP foram presos pela ditadura militar. “Ficamos dez dias incomunicáveis no Quartel da Polícia do Exército da Barão de Mesquita e fomos submetidos à tortura e ao isolamento total”, relata. Ela foi libertada em setembro de 1977, continuou a militância no movimento estudantil e no sindicalismo bancário. Enfrentou, junto com todo o movimento sindical, a partir de 1978, as intervenções da ditadura militar ou direções claramente patronais e vinculadas ao regime.

Repressão aos trabalhadores

Participou da organização do processo eleitoral a fim de reconquistar o sindicato dos bancários para as mãos dos trabalhadores. “Qualquer tentativa de luta, de questionamento aos baixos salários ou a falta de condições mínimas de trabalho ou de organização dos trabalhadores era duramente reprimida. Um exemplo claro dessa repressão foi a intervenção em nosso Sindicato, a perseguição dos dirigentes, com o exemplo mais flagrante de Aluízio Palhano perseguido e morto pela ditadura militar”, lembra Fernanda.

O valor da democracia

Às gerações mais novas, que não viveram e desconhecem o que é uma ditadura, Fernanda Carisio faz um alerta.
“Quem acha que a vida era melhor, realmente, ou tem muito pouca memória ou está muito mal informado. As mobilizações que se iniciaram no ABC e correram como rastilho de pólvora gerando mobilizações de trabalhadores em todo país, tiveram como principais bandeiras as conquistas econômicas. O arrocho salarial era violento. Direitos que hoje consideramos como ‘naturais’ não existiam. Nada de auxílio transporte, auxílio alimentação e refeição, auxílio creche, planos de saúde, abonos, PLR então nem pensar” explicou.
“A inflação absurda chegou a mais de 80% ao mês. Quem pode ter saudade dessas coisas? Enquanto isso os ditadores de plantão falavam em ‘Brasil ame-o ou deixe-o’, em obras faraônicas, nunca concluídas como a Transamazônica e que consumiam rios de dinheiro em mamatas e muita corrupção. E tudo isso sob forte censura da imprensa buscando tapar o sol com a peneira”, critica.
“Com o aumento das lutas dos trabalhadores por melhores condições de trabalho e de vida e por democracia e eleições livres, essas fanfarronices foram sendo desmascaradas. A democracia e a liberdade de organização e manifestação são essenciais para que tais situações não se repitam nunca mais. Precisamos conhecer nossos direitos, saber como conquistamos cada um deles, para que possamos mantê-los e avançar em novas conquistas”, conclui a sindicalista.

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